Em 2024, aposentados e pensionistas de Mato Grosso do Sul denunciaram descontos indevidos em benefícios do INSS envolvendo pelo menos 121 entidades, segundo relatório da Coordenadoria Jurídica da Procuradoria-Geral do Estado (Cjur/Procon-MS). O número é três vezes superior às 41 entidades formalmente contestadas junto ao INSS em todo o país desde a deflagração da Operação Sem Desconto, no fim de abril.
O relatório foi entregue à Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon/MJSP), CGU e Ministério Público Federal, com a recomendação de que investiguem as entidades citadas nas denúncias locais. A procuradora Carla Cardoso Nunes da Cunha reforça que o levantamento não acusa diretamente nenhuma instituição, mas destaca a dimensão alarmante das reclamações.
“Só em MS, foram mais de 4 mil queixas em 23 Procons. Muitas cidades nem contam com um órgão de defesa do consumidor. Isso mostra que os números podem ser ainda maiores”, alertou a procuradora.
Fraudes e fragilidade no controle
Grande parte das queixas envolve descontos não autorizados de mensalidades associativas, que, por lei, só podem ser realizados por entidades previamente autorizadas pelo INSS — o que exige acordo de cooperação técnica, coleta biométrica ou assinatura eletrônica do beneficiário.
Carla Cardoso aponta que a própria Instrução Normativa nº 162 do INSS estabelece critérios claros para esses descontos, que não vinham sendo cumpridos de forma sistemática. Dados da Controladoria-Geral da União (CGU) mostram que o total descontado em favor de associações saltou de R$ 413 milhões (2016) para R$ 2,8 bilhões em 2023, embora o INSS não saiba dizer quanto desse montante foi ilegalmente retirado.
Investigação travada e ação da AGU
A Delegacia Especializada de Repressão aos Crimes Contra as Relações de Consumo (Decon) tentou avançar nas investigações locais, mas enfrentou falta de colaboração do INSS.
“Queríamos apenas saber quem autorizou os descontos. Não conseguimos resposta e enviamos o caso à Polícia Federal”, afirmou o delegado Reginaldo Salomão.
Com base nos indícios, a Advocacia-Geral da União (AGU) moveu ações cautelares para bloqueio de bens de 12 entidades e seus dirigentes, totalizando R$ 2,56 bilhões. Segundo a AGU, tratam-se de empresas de fachada, criadas exclusivamente para fraudar o sistema e que teriam subornado servidores públicos.
A Justiça Federal já bloqueou R$ 119 milhões em cinco ações, enquanto os demais processos seguem em tramitação.
Situação dos aposentados
Até 3 de junho, 2,67 milhões de beneficiários contestaram os descontos junto ao INSS. Apenas 71 mil confirmaram ter autorizado os valores. Isso significa que mais de 97% das contestações apontam irregularidades.
A procuradora Carla conclui que o alto volume de queixas e a ausência de respostas do INSS geraram a necessidade de medidas urgentes:
“Chegamos a discutir uma ação civil pública no conselho estadual de defesa do consumidor. Só não avançamos porque vimos que o problema era nacional.”
O caso continua a mobilizar órgãos de fiscalização e justiça, sendo considerado um dos maiores escândalos de fraude contra idosos registrados no país nos últimos anos.