Tratar cânceres de cabeça e pescoço sempre foi um grande desafio para a medicina. Para se ter uma leitura clara, no Brasil, cerca de 80% dos casos são diagnosticados em estágios avançados, segundo o Instituto Nacional do Câncer (INCA), o que dificulta muito as chances de cura. Quando detectado precocemente, esse tipo de tumor pode ter mais de 90% de chances de cura. Para esses tumores complexos, a imunoterapia, que orienta o próprio sistema imunológico do paciente no combate ao tumor, vem se consolidando como um dos pilares mais promissores na evolução da oncologia nos últimos anos, provocando uma mudança relevante no panorama global do manejo oncológico.
A ciência, por sua vez, tem tentado cumprir seu papel nos esforços para melhorar os desfechos clínicos desses pacientes. Pela primeira vez em anos, um estudo apresentou resultados sólidos com o uso de imunoterapia no pós-operatório de pacientes com tumores de cabeça e pescoço localmente avançados. Batizada de NIVOPOSTOP (GORTEC 2018-01), a pesquisa liderada pelo GORTEC (Groupe Oncologie Radiothérapie Tête et Cou), consórcio europeu referência em tumores de cabeça e pescoço, demonstrou redução no risco de recidiva entre os pacientes considerados de alto risco, justamente aqueles que, até hoje, tinham poucas alternativas eficazes após a cirurgia.
Assim, durante o estudo, o grupo que recebeu a combinação com imunoterapia apresentou melhora em sobrevida livre de doença (DFS) - desfecho primário do estudo – ou seja, houve aumento no tempo para que ocorresse eventual recidiva do tumor. Após seguimento maior, dados de chance efetiva de cura (ou, tecnicamente falando, sobrevida global) serão avaliados e tem sido visto com otimismo.
Essa descoberta promissora mostra como a imunoterapia é uma opção no combate a esses tumores, ao mesmo tempo que reforça a importância de ampliar a discussão sobre a necessidade de viabilizar o acesso a tecnologias que já provaram seu benefício. Investir em pesquisas é pré-requisito para transformar conhecimento em benefício concreto. Mas é a união entre a ciência e os sistemas público e suplementar de saúde que poderão transformar descobertas em soluções e ganhos reais para a população.
O desafio, portanto, não está apenas na descoberta de novas alternativas terapêuticas, mas em garantir que esses avanços cheguem ao paciente na hora certa, no momento certo. Isso exige mais do que nunca articulação de iniciativas que envolvam o setor privado, público e a sociedade como um todo. Não se trata apenas de incorporar medicamentos de última geração, mas de garantir um cuidado mais assertivo, eficaz e sustentável para todos.
*Stephen Stefani
Oncologista da Oncoclínicas no Rio Grande do Sul
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