Desde 2017 a região não registra as cheias que ciclicamente alagavam vastas áreas da planície pantaneira. Sem elas, cobertura vegetal ressequida é combustível para a propagação do fogo.
Os primeiros indicativos de que neste ano o Pantanal pode voltar a sofrer queimadas severas já começaram a ser registrados, com recentes focos de incêndios de grandes proporções no município de Porto Murtinho e no Parque Estadual do Rio Negro (Abobral).
Segundo informa o governo do estado, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) registrou, nos primeiros seis meses deste ano, 589 focos de queimadas no bioma pantaneiro, aumento de 47% em relação ao mesmo período de 2021.
O panorama se torna ainda mais crítico quando o próprio INPE informa que, enquanto em todo o último mês de junho foram identificados 111 pontos de incêndio na região, este número saltou para 128 somente nos primeiros oito dias deste mês.
Ainda que, neste momento, não esteja no horizonte uma catástrofe ambiental como a de 2021, quando só na parte sul-mato-grossense do bioma pantaneiro 1,7 milhão de hectares foram varridos pelo fogo, especialistas apontam que índices de chuvas abaixo do esperado praticamente anteciparam o período de seca – tradicionalmente, de abril a setembro – aumentando os riscos de incêndios.
Outro sério agravante está no fato de que desde 2017 a região não registra as cheias que ciclicamente alagam vastas áreas da planície pantaneira.
O longo hiato nessas providenciais inundações contribui com uma série de fatores que favorecem o alastramento de grandes queimadas, como extensas áreas de vegetação ressequida, e canais, baías e corixos secos ou tomados por vegetação ‘oportunista’, o que dificulta que bombeiros e brigadistas cheguem a tempo aos focos de fogo.
Ainda que em termos científicos persistam divergências sobre conexões diretas entre os fenômenos naturais anômalos – chuvas escassas, por exemplo – na região e as mudanças climáticas globais, o fato real e urgente é que o Pantanal, por suas próprias características tão exuberantes e majestosas quanto delicadas e frágeis, merece mobilização permanente de competências humanas, financiamento adequado e equipamentos eficientes para responder ao desafio que é de todos nós: prevenir os danos potenciais a esse patrimônio natural da humanidade. Ou, pelo menos, atenuá-los a um patamar que não comprometa seu extraordinário poder de regeneração.
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A propósito, apenas alguns meses após as catastróficas queimadas de 2020 a mídia já começava a celebrar o milagre do renascimento do Pantanal que, “ressurgindo das cinzas”, aparentemente recobrava suas características excepcionais de bioma único no planeta.
Ocorre que, de acordo com cientistas e pesquisadores, após os desastrosos incêndios que devastaram 26% do bioma e teriam dizimado dez milhões de animais, a mãe natureza levará décadas para a completa regeneração do ecossistema pantaneiro. Caso tenhamos competência e responsabilidade para evitar que um desastre daquelas proporções se repita.
Diante do que, o precoce surgimento de queimadas no Pantanal, cujo combate tem exigido significativa mobilização de homens e equipamentos, acende grave sinal de alerta.
*Iran Coelho das Neves
Presidente do Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso do Sul.
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