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ENTREVISTA Quarta-feira, 19 de Fevereiro de 2014, 14:15 - A | A

Quarta-feira, 19 de Fevereiro de 2014, 14h:15 - A | A

“Falta ter uma gestão descentralizada”, diz Mario Cesar sobre “modelo Bernal” de governar

Anahi Zurutuza - Capital News (www.capitalnews.com.br)

Casado e pai de três filhos, o auditor fiscal do município de Campo Grande foi eleito vereador da Capital em 2008 e já no segundo mandato assumiu o posto de presidente da Câmara Municipal, em 2013. Logo num ano atribulado, no ano que todos se assustaram com manifestações de rua e com previsões políticas que não se concretizaram. Ao Capital News, o vereador Mario Cesar (PMDB) faz balanço da atuação do Legislativo e do Executivo no ano de 2013 e fala dos planos para 2014.

Capital News: Qual a avaliação que o senhor faz da atuação da Câmara Municipal em 2013, uma vez que, no ano passado, parte da Casa foi ocupada por vereadores novos e também que, pela primeira vez, em décadas, a Câmara teve a maior parte das cadeiras ocupadas por legisladores que fazem oposição ao prefeito municipal? O Legislativo trabalhou mais, trabalhou melhor ou teve mais dificuldades?

Mario Cesar: Foi tudo novo. Tivemos em 2013, 29 vereadores e, até então, eram 21. Dos 29, 16 eram novos, ou seja, deu uma grande oxigenada na Câmara Municipal, até porque a qualidade dos vereadores que para cá vieram é muito boa e nós conseguimos quebrar algumas regras, que não existiam nos anos anteriores. Nos propomos, durante as campanhas, fiscalizar, observar como está sendo aplicado o dinheiro público, fazer valer a posição de vereador. No início algumas pessoas interpretaram de maneira equivocada, diziam que a Câmara fazia perseguição, que nada disso era feito com o governos anteriores, mas se nós puxarmos para 2012, o resultado da eleição mostrou que a população queria isso, queria mudança comportamental, tanto é que o fez na escolha do prefeito de Campo Grande.

Capital News: O senhor acredita, então, que a Câmara Municipal foi mais atuante no sentido de fiscalizar o Executivo municipal, que é uma das atribuições do Legislativo?

Mario Cesar: Muito mais ativa. Eu até tenho falado isso, a gente tem de entender o que o eleitorado quer hoje, o que a população está pensando. E a Câmara, neste ano, foi muito mais próxima das pessoas, com a Câmara Ativa, com as campanhas contra a dengue e a “Beber e dirigir: uma combinação que não dá certo”, fizemos uma audiência pública, que foi a primeira vez na Câmara Municipal, que foi a audiência pública de ouvir os conselheiros municipais e as lideranças de bairros, o que nós entendemos do poder local. Com o entendimento de que nós somos só interlocutores de tudo isso, a Câmara foi muito mais voltada para a sociedade, mais preocupada em ouvir. Fizemos 21 sessões comunitárias.

Capital News: Quais os principais resultados colhidos desse programa Câmara Ativa e, é claro, das sessões itinerantes?

Maria Cesar: Fizemos uma Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) muito mais voltada para os interesses da população, dos bairros. Foi a primeira LDO com mais de 70 emendas parlamentares nos últimos anos. Tivemos um debate junto a sociedade, no que tange aos interesses locais. Fizemos um orçamento inclusive com emendas tiradas dos conselhos regionais, quer dizer, os conselhos elegeram suas prioridades e pediram para que os vereadores colocassem emendas dos conselhos e isso foi distribuídos entre os vereadores para que pudessem ser feitas essas emendas em nome da Casa para os conselhos regionais. Fizemos mais de 50 audiências públicas e de uma dessas é que surgiu, por exemplo, a redução da tarifa do transporte coletivo e a criação do Fundo Municipal para subsidiar todas a gratuidades, saiu a criação da Secretaria Municipal do Idoso, Pessoas com Deficiência e Mobilidade Reduzida, na tentativa de fazer uma Capital mais acessível para a população. Então, a Câmara esteve muito mais ouvindo a sociedade e colocando em prática aquilo que a sociedade quer.

Capital News: E os projetos de lei que surgiram dessa audiência e também dessas visitas aos bairros, o senhor acredita que a Câmara Municipal vai conseguir ver isso aplicado efetivamente? Até não há como negar que existe uma situação conflituosa entre Executivo e Legislativo. O senhor acha que por causa disso, as leis aprovadas no ano passado serão colocadas na gaveta?

Mario Cesar: A Câmara é chamada de Casa do Povo porque tem de ouvir todas as demandas e transformar estas demandas em indicações, requerimentos, emendas parlamentares e projetos de lei. Quem executa isso tudo é o Poder Executivo. Foi como aconteceu agora, quando 73 emendas dos vereadores foram vetadas, estas emendas não são dos vereadores, são as demandas trazidas pela sociedade. Então, quem não está sendo atendido não é o vereador, é a cidade que não está sendo atendida. Nós vamos continuar com o nosso trabalho e o Executivo tem de fazer a parte dele. O Executivo é que tem um orçamento para isso e um orçamento que dá sim para fazer muitas coisas. É claro que não é possível atender todas as demandas, como, por exemplo, não dá para colocar todas as crianças de uma vez só nos Ceinfs, não dá para dar casa para todo mundo, mas é possível diminuir todo esse sofrimento. Coisa que não aconteceu em 2013. Nós vamos continuar fazendo, mas o problema é de quem assumiu a responsabilidade de ser Executivo de conseguir executar tudo isso.

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Quando o Executivo veta uma emenda, não é o vereador que deixa de ser atendido, mas sim, a cidade, diz Mario Cesar
Foto: Deurico/Capital News

Capital News: No ano passado, pela primeira vez, em um só ano,  a Câmara abriu três Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs). Mas, quais os resultados reais que as duas CPIs já concluídas trouxeram?

Mario Cesar: Desde o começo quando queriam abrir a CPI da Saúde, eu havia dito que era importante não politizar o que já estava sendo feito. Até porque, já existia uma investigação, desde 2009, do Ministério Público e da Polícia Federal e eu acreditava que a gente poderia pouco contribuir com todos os processos já existentes, com tantas horas de gravação. Nós apenas demos vez e voz a algumas pessoas que não puderam ser ouvidas neste cenário, de uma certa feita, houve uma contribuição para os inquéritos que já estavam instaurados, mas não teve uma especificidade única nesta CPI do Hospital do Câncer e do Hospital Universitário. A CPI do Calote não, esta CPI foi diferente, porque nós ouvimos muitas pessoas no que tange a inadimplência, mas também ouvimos as pessoas no que tange as infrações político-administrativas (praticadas pelo prefeito Alcides Bernal). Queríamos entender porque umas empresas eram privilegiadas com o pagamento e outras recebiam com demora. E, com tudo isso, acabamos por receber um leque de denúncias que culminou no encaminhamento dessas informações para os ministérios públicos Estadual e Federal, para o Tribunal de Contas e a Controladoria Geral da União. Por conta disso, também algumas pessoas da sociedade se assenhoraram disso que foi levantado pela CPI, que é pública, que resultou na abertura da Comissão Processante. O viés da CPI do Calote foi de fiscalização no que tange o orçamento público municipal.

Capital News: Esta foi a primeira vez que a Câmara Municipal de Campo Grande abre processo contra o prefeito e tenta tirá-lo do mandato. Mas, o senhor acredita que, depois de a Justiça entrou no processo de julgamento, a Comissão Processante será “enterrada”?

Mario Cesar: Eu faço desse processo uma análise muito fria. Crime político-administrativo, se ocorreu, tem de ser analisado como crime. Não é porque eu sou da base que eu voto contra uma cassação ou porque eu sou oposição que eu voto a favor, eu tenho de ter responsabilidade sobre o meu voto.

Capital News: Na prática a gente sabe que não é assim. Certo?

Mario Cesar: Eu estou fazendo uma análise fria da situação. Não é porque eu estou na base que eu fecho os olhos para o erro ou porque eu não estou na base que eu vejo o erro. A Comissão Processante findou seu trabalho no dia 20 de dezembro e entregou o relatório para a mesa diretora. E o que foi suspensa foi a sessão de julgamento e foi suspensa por decisão de plantão e não de mérito, tanto é que nós estamos esperando a decisão do Tribunal de Justiça com relação ao mérito. Mas, uma coisa que me chama atenção é que em todas as ações que o prefeito entrou contra a Comissão Processante, ele contestar a formatação dela. Em momento nenhum ele entrou em defesa das acusações. Isso seria o cerne da coisa. Então, vamos aguardar a decisão da Justiça para poder dar continuidade a sessão de julgamento.

Capital News: Como o senhor avalia o primeiro ano de mandato do prefeito Alcides Bernal? Na opinião do senhor, ele deixou a desejar?

Mario Cesar: Eu tenho plena clareza disso. Eu não acho, mas tenho certeza. As pessoas estão vendo isso, o abandono que está Campo Grande. Eu ouço apelos recorrentes. Por exemplo, uma coisa é iniciar um mandato, dizer que não tem experiência, e atrasar a entrega de kit escolar, outra coisa, é ter um ano para se preparar e iniciar 2014 cometendo o mesmo erro. Olha os problemas que aconteceram em 2013? A questão da merenda escolar, não recebemos nenhum projeto habitacional, a questão da mobilidade urbana que até agora não teve nenhum projeto iniciado. Outra perda muito grande no que tange a segurança foi o projeto do videomonitoramento, nós tínhamos uma previsão de receber R$ 10 milhões, esses R$ 10 milhões nós perdemos e se tornaram R$ 2,1milhões e até agora não vimos esse dinheiro ser aplicado. Em 2013, nós tivemos de corrigir a LDO. A Lei Orçamentária foi protocolada duas vezes, uma para cumprir o prazo e a outra tentando corrigi-la e aí um não falava com o outro. Então, eu não vejo um resultado eficiente em 2013 para Campo Grande.

Capital News: O que falta? Falta ter equipe mais técnica? Falta preparo desta equipe que já está na prefeitura?

Mario Cesar: Falta ter uma gestão descentralizada. Uma coisa é ser eleito pelo voto popular, outra coisa é ser gestor público. Se eu sou eleito e não tenho essa capacidade, eu tenho de colocar pessoas ao meu lado que tenham e fazer um governo de coalizão. Quem ganha tem de ser generoso. Uma vez que se é eleito prefeito de Campo Grande, não se pode pensar no projeto único e pessoal, mas pensar em ser gestor da cidade a agregar. Fazer uma gestão compartilhada com outras pessoas, outros partidos é importante e é preciso delegar poderes para que isso aconteça. Não quero crer que as pessoas que estão ao lado do prefeito são incompetentes, mas a leitura que nós temos, pelo que a gente ouve em cada secretaria, é de que falta liberdade para fazer a gestão. Os secretários estão sendo cerceados. A burocracia emperra todo o processo, perde-se tempo, perde-se prazos e perdemos recursos.

Capital News: Então, o senhor acredita que a troca de apoio ao prefeito por indicações para cargos em secretarias e até para o comando das pastas, situação que até foi criticada por alguns, é uma forma válida, para que o prefeito consiga ampliar a base e tenha mais facilidade para governar? Em sua opinião, isso já deveria ter sido feito?

Mario Cesar: Volto a repetir. Não adianta entregar as secretarias para os partidos, se o indicado não conseguir ter gestão sobre ela. Não estou vendo o prefeito querer fazer uma gestão compartilhada, estou vendo ele só querer ter base para não ser cassado. E não vejo no prefeito de Campo Grande o espírito de gestão, eu vejo o espírito de preservação num processo de cassação. Esse modelo de administração está fadado ao fracasso.

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Para o presidente da Casa de Leis, não adianta entregar secretarias para partidos se quem for indicado ão ter gestão sobre ela
Foto: Deurico/Capital News

Capital News: O prefeito Alcides Bernal reclamou à imprensa, por diversas vezes, que os vereadores não o deixam trabalhar. Ter uma Câmara oposicionista dificulta o trabalho do Executivo?

Mario Cesar: Muito pelo contrário, porque muitas vezes balizamos o prefeito do que fazer e balizamos o prefeito do que não fazer. Findou-se 2013, com um orçamento de mais de R$ 3 bilhões, e o que foi feito em 2013? Como é que nós não o deixamos trabalhar se é ele quem faz a gestão deste orçamento. Às vezes dizem que a Câmara Municipal avançou na sua competência e eu digo: nós só avançamos por conta da omissão dele. Como nós não estamos deixando o prefeito trabalhar se tudo, 100% do que o Executivo mandou para esta Casa foi aprovado? Não teve nenhum entrave com relação a isso? Tivemos algumas correções que foram feitas e, assim que foi feita a correção, nós aprovamos. Um exemplo são as secretarias da Mulher e da Juventude, que foram aprovadas por esta Casa, com suplementação, e até hoje não tem ninguém ocupando as pastas. Só mais um exemplo: o empréstimo de R$ 420 milhões que foi aprovado no início do ano e até agora não vimos nada disso ser aplicado. A Câmara não parou, a Câmara não vai parar e isso é problema do Executivo.

Capital News: Como foi a experiência de, num ano tão atribulado, assumir a presidência da Câmara Municipal?

Mario Cesar: Eu quando ganhei a eleição em janeiro de 2013, no mesmo dia eu chamei todos os vereadores e disse: “eu não sou presidente só dos 20 que votaram em mim, sou presidente dos 29”. E chamei todo mundo para fazer uma gestão compartilhada. Eu acredito que consegui fazer isso, dei liberdade para todos os vereadores trabalharem. Tanto é verdade que as comissões apareceram, as audiências públicas que todos os vereadores fizeram, as CPIs. Agora, nem os mais pessimistas acreditavam que teríamos tantos problemas neste ano de 2013. Eu só tenho a agradecer a Deus por ter me dado tanta sabedoria para poder conduzir todos esses processos, ter tido serenidade. Nem eu sabia que eu tinha essa capacidade. Para mim foi uma vitória, aprendi muito, cresci muito e agora estou preparado para outros desafios.

Capital News: O senhor continua na Câmara ou sai candidato?

Mario Cesar: Eu continuo na Câmara, porém saio candidato a deputado estadual. Quero encarar novos desafios, poder contribuir com o Estado. Sou um político muito mais técnico, do que da política em si, do que do discurso, até por conta da minha profissão que sou auditor fiscal.

Capital News: Vai ter uma debandada de vereadores nestas eleições? Outros parlamentares pretendem tomar novos rumos como o senhor?

Mario Cesar: Essa debandada vai acontecer se a população quiser. A maioria dos vereadores será candidato, alguns querem a Assembleia e outros a Câmara Federal.

Capital News: Isso muda muita coisa na relação da Câmara com o Executivo. A entrada de novos vereadores no ano que vem, a partir do momento que os que aqui estão assumirem outros mandatos, pode ser a oportunidade do prefeito que ampliar e consolidar a base aliada dele?

Mario Cesar: Se o prefeito continuar na mesma linha de raciocínio, pode mudar quantos forem os personagens, que nada vai mudar para ele. Ele não vai conseguir ampliar a base ou melhorar a atuação dele. Enquanto ele continuar nos mesmos moldes, podem trocar todos os 29 vereadores que essa gestão não vai ser eficiente.

Capital News: O prazo dado pela Justiça para que a Câmara desocupe o prédio onde está findando. Como vai ser? Os vereadores terão mesmo de deixar a sede?

Mario Cesar: A continuar como está, é mais uma infração administrativa cometida pelo prefeito. Há mais um crime de responsabilidade do prefeito de Campo Grande. Porque no início de 2013, com a popularidade dele em alta, a pecha de que os vereadores são os caloteiros, que a Câmara não pagava aluguel. Mas, essa responsabilidade sempre foi do prefeito e não só desse prefeito que aí está, mas de quem foi prefeito de Campo Grande também. Tanto é que a Câmara se inseriu no processo lá atrás e a Justiça tirou a Câmara do processo. Ou seja, no processo existe a prefeitura e os donos do prédio, porque nós não temos personalidade jurídica. Então, o que foi feito, desde 2005, economizava-se o duodécimo e devolvia-se para o Executivo, para que o Executivo buscasse uma solução. De 2005 a 2012, foram devolvidos mais de R$ 38 milhões ao prefeito de Campo Grande. O que eu fiz diferente dos presidentes anteriores, foi externar isso, foi dizer que a Câmara, no ano de 2013, iria achar uma solução para resolver o problema dela, mesmo não tendo responsabilidade de resolver. Fizemos uma economia de duodécimo, R$ 7 milhões, achamos uma área pública da União, em frente ao CMO, que seria doada para fazer a Câmara de Vereadores. Nós apresentamos essa proposta ao prefeito e ao Ministério Público Estadual (MPE), para mostrar que a Câmara está fazendo a sua parte. Daqui para frente não podemos fazer mais nada. O prefeito veio com várias histórias, de jogar a gente na antiga rodoviária, de jogar a gente no antigo Cnec. E, eu falo jogar porque ele sempre fala de maneira pejorativa. Hoje temos, então, R$ 45 milhões e hoje a dívida se fala em R$ 26 milhões. Então, tem como resolver, dá para comprar esse prédio.

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A responsabilidade do prédio da Câmara sempre foi do prefeito, do que está e de quem já foi, disse Mario Cesar Capital News: Mas, por enquanto, não existe luz no fim do túnel?
Foto: Deurico/Capital News

Capital News: Mas, por enquanto, não existe luz no fim do túnel?

Mario Cesar: Espero que o prefeito não cometa mais esse crime administrativo.

Capital News: Isso pode resultar num outro processo contra o prefeito?

Mario Cesar: Num outro processo. O próprio procurador da prefeitura à época, Luiz Carlos Santini, no dia 15 de agosto de 2013, disse isso. Que isso pode resulta em outro processo e até cassação. Ele disse isso o dia 15 de agosto em audiência no Ministério Público sobre esse assunto.

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