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Opinião Sábado, 24 de Maio de 2025, 18:15 - A | A

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Indústria de papel e celulose segue avançando rumo ao net zero

Por Alexandre Dias*

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Setor aposta em automação, digitalização e eficiência energética para reduzir o uso intensivo de energia em seus processos produtivos

A indústria de papel e celulose brasileira tem uma posição sustentável privilegiada. Praticamente todas as empresas já apresentam balanço negativo de carbono, graças à disponibilidade de energia renovável no país, além da geração própria, e ainda pelo fato de a operação florestal nos trópicos sequestrar carbono atmosférico em maior escala.

Essas vantagens, contudo, não fazem parte da realidade do setor numa perspectiva global. A indústria de papel e celulose ainda emite 0,6% dos gases de efeito estufa e consome 6% da energia elétrica gerada no planeta. Também é grande consumidora de água em processos florestais e no beneficiamento químico, tendo, assim, desafios ambientais relevantes a enfrentar.

A boa notícia é que a descarbonização do segmento vem avançando rápido, aliás, mais do que em outros segmentos industriais. De acordo com a Agência Internacional de Energia (IEA, na sigla em inglês), na média, o segmento registrou quedas anuais de emissões de 3% entre 2010 e 2022, a despeito de a produção de papel e papelão ter aumentado drasticamente no período.

Na Europa, de acordo com a Confederação Europeia de Empresas de Papel e Celulose, entre 1990 e 2023, as emissões de CO2 por tonelada de papel e celulose fabricada recuou 55%, com ampliação do uso de biomassa na geração de energia. Situação parecida vem ocorrendo nos Estados Unidos, onde as emissões relacionadas à produção final, de acordo com a Autoridade de Proteção Ambiental do país (EPA, na sigla em inglês), recuaram 21% entre 2011 e 2021, para 39,4 milhões de toneladas anuais de CO2.

Apesar desses avanços, excelentes, deve-se dizer, especialmente por ocorrerem em regiões do mundo ainda dependentes de eletricidade fóssil em grande medida, é fato que muito ainda precisa ser feito para que o setor alcance a meta de ser neutro em carbono até 2050, meta que passa pela transição da geração de energia de fontes fósseis para de origem renovável e descarbonizada e, ainda, pelo investimento em eficiência, para avançar produtividade e uso efetivo de recursos, especialmente da energia.

Um relatório recente da empresa de automação ABB trouxe informações relevantes sobre como algumas das maiores produtoras de papel e celulose do mundo estão enfrentando os desafios da descarbonização em seus respectivos parques fabris, cuja descarbonização lhes compete de imediato. Os resultados dessas medidas também têm servido para inspirar outros segmentos industriais em seus esforços, já que partem de soluções também aplicáveis a eles.

Entre as estratégias de descarbonização mais efetivas está, por exemplo, a substituição de motores elétricos por modelos de menor consumo e associados a inversores de frequência para ajustar o torque e o consumo de energia à estrita necessidade de sua aplicação. Também há investimentos em digitalização e em automação, que vêm favorecendo a produtividade e a racionalização do uso de energia em diferentes processos de plantas de papel e celulose, gerando eficiências representativas.

A chinesa UPM, por exemplo, uma das empresas citadas no relatório, em sua planta de Changshu, noroeste da China, conseguiu reduzir o consumo de energia em 20% com a troca dos motores por modelos de magneto permanente e com a otimização do sistema de inversores. A empresa afirma ainda que, em um único rebobinador da máquina de papel, a troca do inversor de frequência resultou na redução mensal de 5% do consumo de energia.

Projeto parecido foi realizado em Rethel, na França, em planta da Smurfit Westrock, que atualizou todo o sistema de bombas de água com motores novos, acoplados a inversores. O sistema de aeração dos tanques de secagem também foi trocado com aeradores novos, de menor consumo, e tiveram a velocidade ajustada para o mínimo necessário à sua função, para reduzir o gasto com energia, que já se percebe menor e segue em aferição.

Os processos envolvendo troca de calor são outro desafio crucial. Muitas empresas ainda utilizam secadores a combustível fóssil, quando já estão disponíveis soluções para processos de secagem de até 400 ºC, os mais comuns da indústria de papel e celulose, como secadores elétricos a plasma, já consolidados como solução tecnológica, especialmente nas plantas que conseguem gerar a própria eletricidade.

A norueguesa Vafos Pulp, por exemplo, conseguiu mitigar 14 mil toneladas de carbono de suas emissões anuais apenas trocando os secadores de papel e celulose a óleo por modelos elétricos, abastecidos com eletricidade descarbonizada. A Smurfit Westock também busca o uso da tecnologia de bombas de calor, que reaproveita o calor de vários de seus processos na geração imediata de vapor para produzir eletricidade extra.

Já no fronte da automação, a polonesa Mondi Swiecie decidiu implantar um controle avançado para reger os processos químicos de cozimento que reduziu a variabilidade do número kappa em 56% e perdas alcalinas no branqueamento em 30%, elevando, portanto, a lucratividade geral da planta e liberando recursos para outros investimentos.

A sueca SCA Ostrand também decidiu conduzir um amplo programa de automação de suas plantas, vendo vantagem, inclusive, na aquisição de um simulador para treinar equipes. A ideia é que os colaboradores utilizassem a tecnologia com total familiaridade e fossem capazes de responder rapidamente a disrupções com potencial para afetar a produção.

Esses exemplos mostram como a indústria de papel e celulose está se movimentando para se tornar ainda mais eficiente, sustentável e, principalmente, neutra em carbono antes de 2050, fazendo, assim, a sua parte nos compromissos firmados no contexto do Acordo de Paris.

Se a indústria brasileira de papel e celulose já tem vantagens sustentáveis que a colocam numa posição privilegiada em relação a outros países, pode-se esperar que seja uma referência ainda mais destacada à medida que essas tecnologias se consolidem no setor.


*Alexandre Dias
Gerente de negócios para Indústrias de Processos da empresa de automação industrial ABB.

 

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