Como sempre tenho dito em meus textos, os acontecimentos e todas as percepções que chegam a nós todos os dias têm nos mostrado que estamos vivendo em um período repleto de inúmeras crises, crises essas que têm sempre nos afetado, seja de uma forma ou de outra. Mas esse estado de coisas não é algo exclusivo de nossos tempos, pois, ao longo da história, muitos foram os momentos em que a sociedade foi assolada por diferentes crises, e isso simultaneamente, já que, como tenho dito em vários artigos: uma crise sempre leva a outra crise. Mas, na raiz de todas as crises que tanto conhecemos, existe uma crise mais íntima e profunda que nos leva a todas as outras crises: a crise espiritual.
Em cada época de colapso civilizacional, antes que as estruturas políticas ou econômicas ruíssem, já havia se esvaziado o coração espiritual do povo, de maneira que as crises econômicas e políticas não passavam de uma manifestação visível da crise alojada no coração do povo: a crise moral, proveniente do rompimento com os princípios justos e verdadeiros que guiavam a humanidade por meio do ensino dos princípios espirituais. Dessa forma, a crise espiritual precede e serve como fundamento de todas as outras, pois é da alma que emanam os valores, os compromissos e as esperanças que podem vir a ser capazes de sustentar a ordem social. Quando a alma se torna corrupta, nenhum organismo social permanece de pé por muito tempo.
Dessa forma, podemos dizer que, para aqueles que creem, a espiritualidade não é um adorno da cultura — ela é seu alicerce invisível. E, como bem intuiu Dostoiévski em Os Irmãos Karamázov: "sem Deus, tudo é permitido". Sem a âncora espiritual que dá sentido e limite às ações humanas, o colapso do espírito traz, como consequência inevitável, o colapso das instituições.
Nossa sociedade atual, completamente influenciada pelo relativismo e saturada de estímulos, vive uma espécie de anorexia espiritual: rejeita todo alimento que a nutre e fortalece e se vicia em todo tipo de alimento que a destrói. Essa negação do transcendente provoca uma amputação simbólica profunda em diversas áreas, pois, sem uma referência superior, tudo perde densidade: o amor se torna desejo, a justiça vira cálculo, a verdade se reduz à opinião. E, assim, o homem pós-moderno se torna um órfão voluntário do Sagrado.
O que chamamos hoje de "crise de integridade", "colapso institucional" ou "decadência da educação" são sintomas visíveis de uma enfermidade muito maior, mais silenciosa, mais letal e muito anterior a tais manifestações visíveis: são sintomas da perda e da desvalorização da dimensão espiritual. Quando a dimensão sagrada da vida é ridicularizada ou, até mesmo, completamente abandonada e deixada de lado, tudo que se constrói em seu lugar é frágil, provisório e, muitas vezes, vão, não preservando o sentido, o valor ou a profundidade daquilo que é, inerentemente, Sagrado.
Sem transcendência, dificilmente pode existir um verdadeiro e profundo compromisso com as questões verdadeiramente morais, que conduzem as ações humanas. O bem se transforma em pura conveniência, e a consciência se rebaixa ao gosto do momento. A crise espiritual nos tornou incapazes de aspirar àquilo que é verdadeiramente eterno. Vivemos presos a um tempo avesso às coisas verdadeiramente profundas, um tempo onde impera a lógica e a satisfação imediatista, onde a única urgência é o prazer e o único critério é a aceitação social.
Enquanto não recuperarmos a espiritualidade como centro da existência, todos os discursos sobre reforma política, ética pública ou educação integral estarão fadados ao fracasso. Não se reconstrói uma civilização sem reconstruir o espírito. Toda reforma humana verdadeiramente impactante e duradoura nasce de uma profunda reforma espiritual. O homem novo, de que tanto falam os engenheiros sociais, não é aquele fabricado por sistemas, mas aquele que reencontra sua fonte.
Toda renovação profunda é, antes de tudo, uma conversão interior. É na solidão da alma, diante do absoluto, que se forjam os caminhos da verdadeira mudança. Não há revolução mais radical do que aquela que restaura o elo entre o homem e o eterno. Não há revolução mais radical do que a que ocorre no interior do ser humano e que serve de motivação para todas as outras reformas exteriores de que tanto necessitamos.
Se quisermos restaurar a sociedade, devemos recomeçar pelo invisível. A nova política começa no altar. O novo pacto social só é possível se houver, antes de tudo, um novo pacto com o Sagrado.
*Wanderson R. Monteiro
Dr. Honoris Causa em Literatura e Dr. Honoris Causa em Jornalismo.
Bacharel em Teologia, graduando em Pedagogia.
Acadêmico correspondente da FEBACLA. Acadêmico fundador da AHBLA. Acadêmico imortal da AINTE.
Autor dos livros “Cosmovisão em Crise: A Importância do Conhecimento Teológico e Filosófico Para o Líder Cristão na Pós-Modernidade”, “Crônicas de Uma Sociedade em Crise”, “Atormentai os Meus Filhos”, e da série “Meditações de Um Lavrador”, composta por 7 livros.
Autor de 10 livros.
Vencedor de 4 prêmios literários. Coautor de 15 livros e 4 revistas.
(São Sebastião do Anta – MG)
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