O presidente da OAB/MS (Ordem dos Advogados do Brasil em Mato Grosso do Sul), Fábio Trad, concedeu uma entrevista exclusiva ao site Capital News onde avaliou seus dez meses de mandato frente à Ordem. Trad também falou sobre a luta contra as pensões vitalícias a ex-deputados e ex-goverandores entre outros assuntos. Acompanhe!
CP NEWS: Presidente, o senhor completa um ano a frente da OAB/MS em janeiro. Como o senhor avalia esses dez meses de trabalho?
Fábio Trad : Minha avaliação é muito positiva. Está sendo uma experiência altamente gratificante, uma vez que nós tivemos a oportunidade de conquistar e avançar muito para os advogados. A OAB trabalha no aspecto coorporativo e institucional. No aspecto institucional a OAB se posicionou de forma categórica a favor dos Direitos Humanos, a favor do Estado Democrático de Direito, contra a corrupção, a impunidade, aposentadorias ilegais concedidas à ex-deputados estaduais pela Assembléia Legislativa e que, nós encaminhamos ao conselho federal para ajuizar a competente ação. As pensões dos ex-governadores, que foi conquista da Ordem. Estamos trabalhando diuturnamente para colocar a entidade em uma posição de liderança e destaque no contexto das lutas institucionais.
No aspecto coorporativo, muitos avanços. Antes o advogado tinha que, a cada petição protocolada no fórum para o interior, pagar R$ 13,50. Às vezes o advogado tem várias ações, várias petições e por dia, tinha que gastar R$ 100, R$ 150. Nós conseguimos fazer com que, quem pague agora é o cliente que venha a perder a ação no final dela. Isso desonerou e muito o advogado
Também desobrigamos os advogados, que estavam sendo, de certa forma, constrangidos a submeter-se a revistas no fórum, porque se trata do lugar de trabalho do advogado e ele não vai ao fórum para praticar violência, mas para trabalhar. Essa humilhação e esse constrangimento por força da OAB estão sendo evitados.
Agora no fim do ano, conseguimos a suspensão dos prazos processuais. Os advogados vão ter os prazos suspensos para poderem gozar de merecidas férias pelo menos entre os dias 20 de dezembro a 6 de janeiro
Mais do que isso, nós colocamos um posto de atendimento bancário do Bradesco dentro da sala da OAB do fórum para poder facilitar a distribuição das ações dos advogados, recolhimento de custas. Antes era só até as quatro horas da tarde, quando fechava o banco. Agora você pode distribuir as custas das oito horas da manhã até as 18. Isso facilita imensamente a vida dos advogados
Aumentamos o repasse para as sub-sessões do interior. Hoje não se vê mais sub-sessão ligar para seccional pedindo dinheiro para comprar café, açúcar, papel para impressora. Hoje nós temos um equilíbrio efetivo, dotando as sub-sessões de condições financeiras para ter uma autonomia.
Muitas outras conquistas justificam nosso entusiasmo frente à Ordem.
Agora no segundo ano, depois que nós reequilibramos o orçamento da instituição, vamos construir espaços condignos nos presídios para que os advogados possam estar reservada e individualmente com seus clientes, facilitando inclusive o direito constitucional a ampla defesa. Ainda não foi possível fazer este ano porque vai exigir muitos investimentos, já que são muitas entidades prisionais defasadas nesse quesito.
CP News: O cancelamento de pensões vitalícias a ex-governadores do Estado foi uma das grandes vitórias da ordem este ano. Logo depois um novo entendimento sobre o assunto. O que isso representa para o senhor?
Fábio Trad : Assim que conseguimos a vitória no Supremo, caçando a pensão vitalícia dos ex-governadores que obtiveram a pensão posteriormente a Constituição de 88 eu determinei a elaboração de um estudo constitucional sobre a legalidade das pensões pagas aos outros ex-governadores, Wilson Barbosa Martins, Ramez Tebet, Arry Amorin, Marcelo Miranda e Pedro Pedrossian. Um estudo muito bem preparado pelo constitucionalista André Borges concluiu o seguinte: a constituição de 1967 previa expressamente e autorizava a constituição de subsídios mensais para ex-governadores, de maneira que, pensões constituídas antes de 1988, são constitucionais, porque havia previsão legal. Pensão constituída pós 88, por não haver previsão legal, considerada inconstitucional. Em virtude disso, a conclusão do conselho seccional foi a seguinte. Provocar a Secretaria de Estado de Administração para saber se os ex-governadores passaram a receber a pensão antes ou depois de 88. Havendo previsão na Constituição de 67, opera-se o fenômeno do Direito Adquirido, que é um instituto jurídico inclusive previsto na Constituição. Sendo constituída depois de 88, ilegal e inconstitucional.
A secretária de Estado de Administração, em um primeiro momento apresentou ofício dizendo que as pensões pagas ao doutor Wilson, Pedro Pedrossian e Marcelo Miranda foram constituídas depois de 88. Isso fez com que eu, acreditando na informação prestada pela secretária, anunciasse que entraria com a ação porque era inconstitucional.
Como isso foi ventilado na imprensa, doutor Wilson, Pedrossian e Marcelo Miranda apresentaram a OAB documentos que comprovaram que o ofício apresentado pela secretária não condizia com a realidade. Porque eles apresentaram holerite relacionado ao pagamento dessas pensões antes de 88.
Criou-se, portanto, um impasse. Um ofício da secretária de administração dizendo uma coisa e os documentos apresentados dizendo outra. Qual foi a posição da OAB? Se nós, naquele momento ingressássemos com uma ação, mesmo ciente dos documentos apresentados pelos ex, nós poderíamos ser condenados por litigância de má fé. E a entidade poderia pagar uma multa porque, sabendo da ausência de direito mesmo assim, recorreu ao judiciário.
Por prudência, mesmo assim, nós novamente provocamos a secretária e ela pedindo desculpas pelo erro primeiro, alegando que não teve acesso aos documentos de uma empresa chamada Cetil, que era uma empresa que tinha todas as informações do Departamento Pessoal do Estado, veio novamente e apresentou um ofício dizendo que não. As constituições das pensões foram antes de 1988 portanto são consideradas legais.
CP News? Sendo assim, como fica a situação do ex-governador José Orcírio Miranda dos Santos?
Fábio Trad : A pensão foi instituída após 1988, ele encerrou o mandato em 2004. A Assembléia Legislativa aprovou uma norma que foi considerada inconstitucional, que o Supremo por dez a um declarou. Agora a aparente incoerência de a OAB ajuizar contar um e não contra outros, esbarra num intransponível óbice jurídico que é o direito adquirido. A OAB não pode ir contra a constituição. A Constituição assegura o Direito adquirido. Se você conquistou esse direito quando a outra constituição previa, ninguém mais tira de você isso, por conta do Direito adquirido. Então nós não podemos jogar para a população só pra fazer festa e nos aventurar de forma irresponsável numa ação já sabendo que ela seria derrotada.
A pensão vitalícia que seria concedida ao ex-governador José Orcírio é fato encerrado e representa uma economia de milhões de Reais em favor do poder público graças a ação da nossa entidade.
CP News: A mídia falou muito sobre a pensão que foi concedida ao ex-governador José Orcírio, mas falou pouco sobre quem fez a lei. De que maneira a OAB poderia estar monitorando e lutando contra certos projetos de lei que ferem o cidadão como no caso das pensões?
Fábio Trad : Já prevendo situações de risco dessa natureza, a OAB avançou e constituiu no âmbito do poder legislativo estadual, uma bancada parlamentar da advocacia. Hoje contamos com oito ou nove deputados estaduais que estão alinhados programaticamente com estatuto da Ordem e se comprometeram solenemente a defender os princípios da advocacia. É claro que as discussões político partidárias às vezes podem desvia-los do foco, mas esse é o caminho que nós entendemos seguro para impedir desvarios dessa natureza.
CP News: Em sua campanha pela presidência da ordem o senhor falou muito sobre a valorização dos jovens advogados em mato grosso do sul? Como está esta questão atualmente? Algo mudou?
Fábio Trad : No primeiro dia da nossa gestão o conselho seccional institui o programa de anuidade diferenciada, que permite aos advogados, pagarem uma anuidade menor que aqueles que já tinham uma clientela cativa. Temos uma comissão do novo advogado, atuante, que já estabeleceu pontos de contato com as universidades para garantir o acesso desses acadêmicos, bacharéis ao mercado de trabalho.
Estamos lutando junto ao Tribunal de Justiça para garantir o direito dos primeiros, segundos e terceiros anistas de Direito a fazerem cargas dos autos, e terem, portanto, maior possibilidade de inserção no mercado de trabalho. O novo advogado é tratado em nossa gestão de uma forma diferenciada. Tanto é verdade que nós destinamos um acento do conselho seccional para um novo advogado, é inédito porque nunca um novo advogado teve um espaço de poder. E hoje nós temos através do conselheiro Nilton Junior.
Palestras estão sendo realizadas, a Escola Superior da Advocacia está atuante com relação ao novo advogado. Tanto que trouxe pela primeira veza PUC de São Paulo para fazer um curso de pós-graduação. Hoje vc não precisa mais viajar para São Paulo, sair da sua casa, da sua cidade e gastar muito mais para se manter lá, se temos a PUC aqui, com professores renomados internacionalmente, dando aula em Campo Grande. Graças a quem? A OAB e a Escola Superior de Advocacia, a preços absolutamente acessíveis para quem quiser se especializar. Isso é conquista para o novo advogado.
CP News: O senhor é um Jovem e atuante presidente e já chegou lutando contra os grandes políticos do Estado, isto te traz algum constrangimento no seu cotidiano?
Fábio Trad : A OAB não é político-partidária. Ela é político-institucional. Ela entende que por ser uma entidade apartidária, tem que se posicionar de acordo com os princípios que regem a sua atuação. Quais sejam, defesa da ordem jurídica do Estado Democrático de Direito e dos Direitos Humanos. Não é contra a política e entende que é um dado inevitável da sociedade. Não há sociedade civil organizada sem política organizada. Por isso não me vejo constrangido de nenhuma forma, estamos tomando posições imparciais.
Para você ter uma idéia, com relação à posição da OAB contra as aposentadorias de ex--deputados, se você tiver a lista dos ex-deputados, vai ver que todos os partidos, inclusive alguns que jamais foram sequer atingidos ou ameaçados por qualquer outra instituição. A OAB teve coragem e, de forma unânime, o conselho seccional deliberou e eles também devem perder essa aposentadoria ilegal porque alguns não contribuíram. Quando se exige do trabalhador contribuição por 35 anos, porque alguns políticos que foram deputados estaduais por três, quatro meses apenas, na suplência, ou dois, três anos, recebem uma aposentadoria de oito mil reais? Esse dinheiro tem q ser revertido para o erário público e nós vamos lutar até o fim para isso.
CP News: A primeira etapa do movimento MS Contra a Violência terminou dia nove deste mês. Qual a avaliação que o senhor faz sobre o movimento? Qual o principal objetivo dele?
Fábio Trad : A avaliação que eu faço é muito positiva. Isso nasceu da abnegação de alguns advogados que são idealistas e por serem, reconhecem que as dificuldades encontradas pela sociedade têm que ser superadas de forma adulta. A OAB não é dona do movimento MS Contra Violência, nunca pretendeu ser. Ela é apenas uma das co-participes deste movimento que pretender ser da sociedade.
O problema da violência é bastante complexo, portanto as soluções não são simples e, a partir do momento que nós diagnosticamos a complexidade do problema da violência, a OAB viu-se com autoridade moral, histórica de convocar várias entidades da sociedade civil para, juntamente com a classe dos advogados, traçar os principais parâmetros de atuação das entidades e da sociedade para colaborar com o poder publico no sentido de combater a violência.
É importante ressaltar que o governo do Estado engajou-se nesta campanha e seria um contra-senso se no começo o Estado, que se engaja na campanha, não venha após a implementação de nossas propostas, efetiva-las. Por isso o primeiro momento do MS Contra a Violência é coroado de êxito. Fomos a única instituição em Campo Grande que conseguiu reunir, em torno de um ideal, que é o ideal da paz, mais de duas mil pessoas no Centro da cidade, todas pregando a necessidade de promovermos uma cultura menos belicosa, mais pacifista em Mato Grosso do Sul.
Já tivemos o apoio do conselho federal, fomos recebidos pelo governador. O presidente da Assembléia e o presidente do Poder Judiciário, também hipotecaram solidariedade. Significa dizer que a OAB não está e nunca esteve neste movimento sozinho. Ou a gente faz isso agora, ou como diz o nosso amigo José Augusto Lopes Sobrinho, que é o coordenador do movimento, daqui uns dez anos nós seremos como São Paulo ou Rio de Janeiro. Então nós não temos alternativas, vamos ter que agir.
CP News: De que maneira a Ordem pretende cobrar do Poder Público, uma solução para a violência no Estado?
Fábio Trad : Fazendo reuniões periódicas através de um conselho que está sendo constituído agora pelo movimento MS Contra a Violência, constituído por várias entidades representativas da sociedade que vai cobrar do Poder Público periodicamente a implementação das ações. Inclusive se for o caso, adotando medidas judiciais para compelir o Poder Público a estabelecer uma política pública de segurança eficiente a altura da importância da questão da violência.
A questão do sistema prisional também é ampla e merece um debate forte e longo. O que poderia ser feito de prático para, se não acabar,
pelo menos amenizar a superlotação nas cadeias e presídios?
O sistema prisional é tratado com muita seriedade pela comissão de Direitos Humanos da Ordem, já fizemos um mutirão para tentar acelerar o processo de execução dos presos. Porque não é mais possível convivermos com presos que ficam mais tempo na prisão do que o que prevê a pena imposta.
Mais do que isso, nós hoje sabemos que as prisões são caras e quem as financia? A sociedade que paga seus impostos. Ocorre que hoje, o índice de incidência é de 65%. Isso significa que, se o regime fechado prisional atendesse o que dispõe a legislação, não haveria esse índice, que é na verdade um dado que traduz que hoje as prisões são produtoras de violência e não atendem mais aos objetivos de re-socialização. Por isso a OAB está agindo e o movimento MS Contra a Violência vai colocar o dedo na ferida.
Enquanto as prisões forem tratadas pela sociedade como um simples repositório de presos, como se eles não fizessem parte da sociedade, como se um dia não precisassem voltar, já q o Brasil não tem prisão perpétua, nós vamos ter que enfrentar esta questão.
CP News: O alto índice de evasão e fugas na colônia penal agrícola em campo grande é um exemplo a ser citado. De que forma este problema poderia ser solucionado?
Fábio Trad : Já era esperado por conta do que o Supremo Tribunal Federal entendeu que agora os crimes hediondos admitem progressão de regime. Antes os crimes hediondos, estupro, tráfico, homicídio qualificado, os presos tinham que ficar dois terços da pena em regime fechado. Com a modificação desse entendimento pelo Supremo, com um sexto os presos já progridem de regime. Eu sempre defendi a tese da progressão de regime. O problema é que houve, em virtude desse posicionamento primeiro, um acúmulo de sentenciados nas prisões.
Quando o Supremo decidiu que com um sexto deveria progredir, houve uma saída de muitos presos para o regime semi-aberto, que não comportava esse número expressivo de sentenciados. Deu no que deu! Então isso ai é muito culpa do Estado porque não se preparou adequadamente para abrigar esse número de presos no semi-aberto.
No regime semi-aberto não há celas fechadas. Eles trabalham durante o dia e durante a noite são recolhidos para os seus dormitórios. Eles trabalham de uma forma, que eu posso dizer a você, favorável ao atendimento que preceitua a legislação. O que determina o alto índice de reincidência é o ócio. Preso tem que ser ocupado, tem que trabalhar, tem que ter religião, tem que ter acesso a orientação de favor, prestação de serviço de assistência social. Quantos e quantos presos eu vi entrarem completamente desassistidos em termos psicológicos, morais, filosóficos e, em virtude do trabalho extremamente valioso de algumas entidades religiosas, eles voltam re-socializados. Mas infelizmente isso é minoria.
A situação de atipicidade de Mato Grosso do Sul, por ser um Estado com mais de 400 quilômetros de fronteira seca com países produtores de substancias entorpecentes. É um Estado que tem conflitos agrários, indígenas seríssimos e que contribuem para o reflorescimento da questão da violência. Em Dourados, por exemplo, não pode ser diagnosticada a questão da violência sem uma análise muito profunda sobre a questão indígena.
Já sabendo desta situação a OAB de Mato Grosso do Sul é a única do País que conta com uma Constituição especial de defesa dos Direitos Indígenas que tem um índio advogado como seu presidente, que é o doutor Wilson. E como conselheiro seccional, um índio também, que é o doutor Marques Willian, de jardim.
O senhor vem de uma família tradicional da nossa política. Existe interesse em seguir futuramente este caminho?
Não. Minha vocação é para atender a minha classe e depois voltar a dar aula. E quero fazer o meu sucessor, isso é um ponto de honra.
CP News: O que o senhor tem programado para o ano de 2008?
Fábio Trad : Vamos multiplicar por dez o nosso ritmo. O segundo ano vai ser de maior número de ações da entidade. Temos uma diretoria coesa. A tesoureira já saneou as finanças da entidade e agora no segundo ano vamos avançar muito e o que não vai faltar é notícia da OAB. Vamos realizar muitas coisas boas para a classe dos advogados.
Quero dizer que às vezes é difícil ser presidente, mas fazendo um balanço de tudo aquilo que tive a oportunidade de aprender, posso dizer que é um orgulho sem igual presidir uma entidade tão forte como a OAB.
CP News: Com tanto tempo dedicado ao trabalho, como fica a situação da família?
Fábio Trad : Na verdade o que acontece é que você ganha uma outra família. É preciso ter a sorte de ter uma companheira compreensiva, eu tenho. Filhos que sabem que eu estou aqui para servir, não para ser servido e, sobretudo a compreensão, dentro da minha casa, de que a vida só vale a pena se for vivida com idealismo porque é muito rápida, é um sopro de vento.
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* Próxima entrevista com o Secretário Estadual de Habitação, Carlos Marun ( Dep. Estadual Licenciado )