Terça-feira, 30 de Abril de 2024


ENTREVISTA Sábado, 13 de Abril de 2024, 08:27 - A | A

Sábado, 13 de Abril de 2024, 08h:27 - A | A

Entrevista

Abril Azul: Um mês para repensar o que sabemos sobre o autismo

Governo de MS lança programa e decreto é publicado em benefício dos autistas

Renata Santos Portela
Especial para o Capital News

Acervo Pessoal

Abril Azul: Um mês para repensar o que sabemos sobre o autismo

Kétilly Dayane Gomes

Concientização! Palavra forte e que tem grande significado especialmente neste mês de abril em que todos os olhos estão voltados para aos autistas e seus familiares. É neste mês que ações informativas, de orientação e esclarecimentos são realizadas através da campanha “Abril Azul”.

Para entender um pouco mais sobre esse transtorno, sintomas, tratamento e os desafios que os autistas e familiares enfrentam, o Capital News conversou com a psicóloga clínica e escolar Ketilly Gomes. Ela é Especialista em Psicologia da Saúde e Gestão Estratégica em Educação Básica (FIOCRUZ), Mestre em Saúde e Desenvolvimento (UFMS).

1. Capital News: O que é o autismo e as suas características?

Kétilly Dayane Gomes: O transtorno do espectro autista (TEA) é um distúrbio do neurodesenvolvimento caracterizado por desenvolvimento atípico, manifestações comportamentais, déficits na comunicação e na interação social, padrões de comportamentos repetitivos e estereotipados, podendo apresentar um repertório restrito de interesses e atividades.

O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é uma condição que afeta comportamentos e habilidades sociais e está presente da vida de cerca de 70 milhões de pessoas no mundo todo. De acordo com dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), uma a cada 160 crianças no mundo possui algum nível de autismo.

2. Capital News: O TEA pode ser identificado já nos primeiros anos de vida ou o diagnóstico de um profissional é dado apenas após os 5 anos de idade?

Kétilly Dayane Gomes: Desde os primeiros meses de vida, existem sinais que podem indicar a presença do TEA. Eles são identificados de algumas maneiras como, por exemplo, no fato deles terem pouco ou nenhum contato visual, dificuldade para fazer amizade, não gostar de ser tocadas, dificuldades para expressar seus sentimentos, restrição alimentar, movimentos estereotipados, dentre outros sinais.

Em alguns casos os sintomas são aparentes logo após o nascimento, na maioria dos casos a doença apenas é identificada após o primeiro ano de vida, período no qual há maior exigência da comunicação, nas relações sociais, no manuseio de objetos.

O diagnóstico está relacionado a uma série de observações e características importantes devem ser levadas em consideração. Essa avaliação pode contribuir para identificar o autismo ainda quando a criança não completou um ano.

3. Capital News: É verdade que o TEA é mais prevalente em meninos?

Kétilly Dayane Gomes: Sim, é verdade. O diagnóstico de autismo em meninos é muito mais comum do que em meninas. A proporção é de uma menina para cada quatro meninos.

O que ainda é alvo de investigação é a razão pela qual isto ocorre. Uma pesquisa recente publicada pelo Centro de Controle e Prevenção de Doenças dos EUA (Centers for Disease Control and Prevention - CDC) apontou a prevalência de autismo de uma para cada 54 crianças de 8 anos. Além disso, o estudo mostra que para cada 1 menina com TEA, há 4 meninos.

Michal Parzuchowski/Pixabay

Entenda o que é o transtorno do espectro autista

Transtorno do Espectro Autista (TEA)

4. Capital News: O que são as Condições ocultas ou invisíveis?

Kétilly Dayane Gomes: Conhecemos o conceito de deficiência visível, como cadeirantes ou pessoas com dispositivos de auxílio à mobilidade. Mas também há muitas pessoas que enfrentam desafios diários devido a deficiências ocultas ou invisíveis.

Deficiências ocultas ou invisíveis são aquelas não percebidas de imediato, variam de distúrbios como ansiedade, depressão e distúrbios do espectro autista, perda auditiva, etc. Embora possa não ser visível para outras pessoas, isso não significa que suas necessidades sejam menos importantes.

5. Capital News: Quais os desafios que essas pessoas enfrentam?

Kétilly Dayane Gomes: Um dos maiores problemas que as pessoas com deficiências ocultas enfrentam é a falta de empatia e compreensão da sociedade e das pessoas ao seu redor. Por serem invisíveis aos olhos, podem ser questionados por outros, o que pode levar a sentimentos de isolamento e inadequação.

Além disso, o estigma social associado a problemas de saúde mental e outros problemas ocultos pode levar à discriminação e à falta do apoio necessário.
Para promover a inclusão, é importante que todos entendam e apoiem as necessidades das pessoas com deficiências ocultas.

6. Capital News: Quais tratamentos são importantes para ajudar no desenvolvimento de um autista?

Kétilly Dayane Gomes: O tratamento do autismo, apesar de não ter cura é capaz de melhorar a comunicação, a concentração e diminuir os movimentos repetitivos, melhorando assim a qualidade de vida do próprio autista e da sua família.

Para um tratamento eficaz, é indicado que seja feito com uma equipe composta por médico, fisioterapeuta, psicoterapeuta, terapeuta ocupacional e fonoaudiólogo, que indicam terapias específicas para cada paciente, e muitas vezes devem ser feitas por toda vida.

Além disso, cuidados com a alimentação e atividades extracurriculares como musicoterapia e equoterapia também podem contribuir muito para a melhora dos sintomas.

7. Capital News: Quem faz o diagnóstico do TEA?

Kétilly Dayane Gomes: O diagnóstico do autismo é feito por profissionais qualificados, após uma avaliação abrangente. Podendo ser diagnosticado por um psiquiatra, um neuropediatra ou um psicólogo capacitado.

8. Capital News: Quais os principais desafios que as pessoas com autismo e seus familiares enfrentam?

Unicef/ONU

Programa TEAtivo promove inclusão esportiva de pessoas autistas

Transtorno do espectro autista (TEA)

Kétilly Dayane Gomes: Antes de tudo, a luta pelo diagnóstico clínico. Isso porque, tal situação, causa transtorno na família pela demora da confirmação. Assim os pais criam à falsa-esperança de que seu filho não seja portador do TEA e que pode ser algo simples e transitório mesmo com as manifestações visíveis do transtorno.

Quando uma família descobre que estão esperando um filho, iniciam-se os desejos, criando expectativas em relação ao filho, quanto ao sexo, às características físicas, e principalmente a expectativa de receber um ser “normal”; é assim que surgem os primeiros problemas. Quando se fala de primeiros problemas que os pais enfrentam ao descobrir o diagnóstico na criança, é algo bastante amplo pela proporção das dificuldades que a família enfrenta, desde os primeiros sinais comportamentais da criança. Estudos mostram que há uma preocupação muito grande em se identificar as características de TEA o mais rápido possível.

9. Capital News: O Governo de Mato Grosso do Sul, por meio da SEC (Secretaria de Estado de Cidadania), lançou o programa 'MS Acessível: com o objetivo de promover a Cidadania para Pessoas com Condições Ocultas ou Invisíveis', para incentivar a aceitação e a compreensão do uso do cordão de girassol. Para você, qual a importância disso?

Kétilly Dayane Gomes: O uso do cordão ajuda na identificação do indivíduo, fazendo com que seus direitos sejam respeitados com mais facilidade. Uma oportunidade de tornar o Estado cada vez mais inclusivo e acolhedor, possibilitando o acesso às políticas públicas diversas que garantem direitos a todos os cidadãos. Uma oportunidade de construção de respeito, inclusão, capacidade de acolher as diversas situações de condições invisíveis ou ocultas que as pessoas têm e muitas vezes incompreendidas. Precisamos tornar este processo visível para que todo tenha capacidade de acolher e construir um mundo mais empático e solidário.

10. Capital News: Também houve a publicação em Diário Oficial, de um Decreto que regulamenta a Lei 5.192 de 10 de maio de 2018 prevendo o cadastro estadual e a carteira de identificação de pessoas com transtorno do espectro autista (TEA). A medida garante atenção integral, pronto atendimento e prioridade no acesso aos serviços públicos e privados, em especial nas áreas da saúde, educação e assistência social. Você acha que esse é um avanço ou ainda falta atenção e esse público?

Kétilly Dayane Gomes: O transtorno do espectro autista faz parte das condições ocultas, chamadas assim porque podem não ser percebidas de imediato. Deste modo a medida garante atenção integral, pronto atendimento e prioridade no acesso aos serviços públicos e privados, em especial nas áreas da saúde, educação e assistência social. De modo geral podemos dizer que as pessoas não precisam ficar andando para cima e para baixo com o laudo na bolsa. Se vão passear, se vão ao hospital, se vão a algum comércio ou precisam um atendimento prioritário, facilita muito na identificação.

11. Capital News: Abril azul e importante por quê?

Kétilly Dayane Gomes: É o momento em que o mundo volta sua atenção para uma causa importante – a conscientização sobre o autismo. Neste mês, conhecido como Abril Azul, várias iniciativas são desenvolvidas para promover a conscientização sobre o Transtorno do Espectro Autista (TEA). Refletindo sobre a importância do mês de conscientização do autismo; mais que uma campanha, o Abril Azul se estabelece como um movimento de celebração à diversidade e promoção da inclusão. Contudo, a conscientização é apenas o primeiro passo nessa jornada para construir uma sociedade mais inclusiva.

12. Capital News: Qual recado você deixa?

Kétilly Dayane Gomes: Nós precisamos de profissionais de saúde preparados para a realização do diagnóstico do autismo, nós precisamos de tratamentos adequados para as nossas crianças, nós precisamos promover a real inclusão dentro do ambiente escolar, nós precisamos preparar a sociedade porque o número de pessoas autistas diagnosticadas tem aumentado, tanto entre crianças como também entre adultos.

Não excluam seus filhos, abrace, ame, beije acolhimento e escuta são fundamentais; as crianças com necessidades especiais entendem muito mais do que nós imaginamos. Eles notam quando são excluídos. Mas, principalmente, eles sentem quando são tratados de forma diferente de todos os outros.

Em meio a campanhas, eventos e iniciativas educativas, é fundamental compreender a complexidade do autismo, desde seus sinais iniciais até a importância do diagnóstico precoce e do apoio contínuo. Vamos gerar e sermos promotores de conscientização nas pessoas que não saibam lidar com deficiências. Autismo é apenas uma forma diferente de ver o mundo, juntos podemos sim construir um mundo mais empático e solidário basta darmos as mãos e seguirmos na luta.

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