Campo Grande Sexta-feira, 17 de Maio de 2024



ENTREVISTA Quinta-feira, 26 de Março de 2009, 15:05 - A | A

Quinta-feira, 26 de Março de 2009, 15h:05 - A | A

Entrevista com o delegado Protógenes Queiroz revela a sujeira da política e mostra que não existem \"mocinhos\"

Da Redação, com entrevista do Brasil Verdade

O delegado Protógenes Queiroz nos deu uma entrevista de seis horas, de 14h30 a 20h30, e saiu lamentando que faltou contar mais coisas, por exemplo a máfia russa e o magnata Boris Berezovsky. Por meia hora, ainda conversou conosco enquanto esperava o táxi. Discorreu que Daniel Dantas, o banqueiro, pode mandar muito, mas é apenas um "braço" de algo mais poderoso - quem sabe o Citigroup? Gravado mesmo, contou histórias arrepiantes. Algumas frases dele ao acaso colhidas dão ideia: "É muita picaretagem!", "A mentira perdura pouco, a verdade é eterna.", "Você vai investigando, vai dar nas construtoras, na concorrência pública, e nos políticos". E sobre um dos casos cabulosos que investigou ficou este diálogo bastante sugestivo:

PROTÓGENES: Querem essa história?

TODOS: Sim!

PROTÓGENES: Vocês não vão dormir direito.

MYLTON SEVERIANO: Como foi sua ida para a Polícia Federal?

PROTÓGENES: É. O encontro. Recebo convite para ser procurador-geral de São Gonçalo. Em 1992 me deparo com um pedido para ajudar num processo de impeachment de um prefeito, Aires Abdala. Falei para o vereador "vamos pegar fatos de repercussão nacional pra ecoar". Peguei desvio de merenda escolar e remédios. Tinha criança desnutrida, e ele desviando. Botava pra vender em supermercado dele.

MYLTON SEVERIANO: Além de corrupção, cruel.

PROTÓGENES: Beira o genocídio. Bebês morriam por falta de leite materno, que poderia ser suprido com leite que o governo dava. Ingressamos com processo, e deu resultado. Era o cacique político da região. E durante o processo foram muitas pressões, ameaças, tentativas de corrupção. Eu sabia que poderia sofrer uma decepção.

FERNANDO LAVIERI: Você temia problemas na votação?

PROTÓGENES: Sim, a vida política é promíscua. O próprio processo eleitoral. Você chega a um eleitor, "o que você vai me dar?" Não pensa no coletivo. Parti para um jogo arriscado. A lei que regula o impeachment dizia que a votação é secreta. Era do regime militar. Falei "terá que ser aberta, quem for a favor do ladrão do dinheiro público vai prestar conta". E o povo gritando "ladrão, ladrão". Os advogados dele sorriram dizendo que estava contrariando a lei. Protestaram. E o povo aplaudindo.

PALMÉRIO DÓRIA: E você foi responsabilizado?

PROTÓGENES: Não. Ganhei. E o doutor Evandro Lins e Silva, no impeachment do Collor, o que fez? Adotou. O processo já estava consolidado. O prefeito tinha que ir pra rua. Aí, no processo do Collor houve a mesma coisa. Perante o Supremo Tribunal Federal consolidou o processo. Percebeu-se que o mais democrático era o voto aberto.

PALMÉRIO DÓRIA: E você não é candidato?

PROTÓGENES: Não. Eu não era, por que seria agora? Entendi que era mais útil à sociedade trabalhando de outra forma, cassando um prefeito, investigando corrupção. Em dez anos dentro da Polícia Federal veja o que produzi pra sociedade. Aí me desencanto. Atentam contra minha vida, sou agredido, iam me sequestrar, passo trinta dias escondido. "Vou é ser advogado e largar esse cargo." Fui advogado, advogando para a colônia francesa, no Rio. E participo de uma concorrência pública representando duas empresas. A Constituição não permitia que empresa estrangeira participasse, a não ser como parceira de empresa nacional. A empresa que representei fez parceria com uma construtora. Ganhamos o processo para fazer a extensão do metrô Botafogo a Copacabana. E fomos surpreendidos por um ato de corrupção da Queiroz Galvão. Ela coloca um dormente que quebra a cada período. O que íamos colocar era de qualidade excepcional. E mais barato. Meus clientes falaram "estamos indo embora, não vamos investir nenhum centavo mais, é um país de ladrão, entre com uma ação indenizatória contra essa construtora". Fiquei decepcionado.

WAGNER NABUCO: A ação está em andamento?

PROTÓGENES: Ganhei em primeira instância, em segunda, está no STJ [Superior Tribunal de Justiça]. É uma ação de mais de 60 milhões.

MYLTON SEVERIANO: Contra a Queiroz Galvão?

PROTÓGENES: Sim, e o Estado do Rio.

PALMÉRIO DÓRIA: Você vai ficar riquíssimo?

PROTÓGENES: Nessa época comprei um Gol zero. E o carro pára a poucos metros, em frente a uma agência do Banco do Brasil. Vi um cartaz de concurso pra Polícia Federal. Delegado, gente, perito. Falei "hum... o caminho é esse". Passei, escondido da sócia, não ia entender como eu ia largar uma carteira que ganhava de 30 a 50 mil dólares por mês, ra viver de salário de funcionário público. Tem momentos que você cuida da sua vida, tem momentos que você olha e vê que falta muito a construir. Não adianta construir pra si, senão você vai viver numa ilha.

PALMÉRIO DÓRIA: Era uma Policia Federal comprometida com...

PROTÓGENES: Era uma guarda pretoriana do regime militar.

MYLTON SEVERIANO: Você acha que apuraram seu passado?

PROTÓGENES: Acredito que sim. E fui chamado em 1998. Abandono as delícias da burguesia e vamos ser funcionário público. Aí vou pro Acre.

MYLTON SEVERIANO: Que situação você viu lá?

PROTÓGENES: Autoridades ligadas ao narcotráfico. Rio Branco tinha 980 pontos de distribuição de cocaína. Uma coisa assustadora. Polícia Militar, Civil, Ministério Público, Justiça Estadual, prefeitura, governador, Assembleia, Câmara Municipal. Um juiz com ponto de drogas, desembargador viciado. “Identifiquei caixa dois, dinheiro de narcotráfico. O grande volume foi de desvio de recurso público, o que me deixou chateado. Aí pegamos os políticos. Sim, Maluf estava lá. Daniel Dantas.”

MYLTON SEVERIANO: Em que ano?

PROTÓGENES: Em 1999. José Roberto Santoro era o procurador que me auxiliava. Abro inquérito por lavagem de dinheiro para o narcotráfico, quebra de sigilo bancário: governador, prefeito, exgovernador, Fernandinho Beira Mar que tinha ligação com o narcotráfico, com a narcoguerrilha colombiana, as Farc, o Hildebrando Pascoal [ex-deputado federal, o "homem da motosserra" que mandou cortar em pedaços um desafeto]. Aí o Santoro dá um parecer paralisando a investigação, dizendo que não poderia investigar [Hildebrando] por lavagem de dinheiro, tinha que comprovar que era narcotraficante. Não dei bola. Fizemos a prisão preventiva por grupo de extermínio. A primeira condenação foi por lavagem de dinheiro. Fechei a investigação em cima do Hildebrando e dos 40 que estavam com ele. Eu disse "doutor Santoro, o tempo é o senhor da razão". Ele disse que eu estava vendo muito filme.

PALMÉRIO DÓRIA: E o Fernandinho Beira Mar?

PROTÓGENES: Onde foi preso? Na selva colombiana, 1999. Saio com a missão concluída. Vou pra Brasília. E tinha um ofício para me apresentar em Foz do Iguaçu. Investigar lavagem de dinheiro, evasão de divisas no Cone Sul. Batizei de Operação Macuco [o "caso Banestado" Banco do Estado do Paraná]. Macuco é típico da região, quem achar um ovo azul do macuco tem vida longa. Se todo o mundo procura e não está vendo, vamos ver se a gente enxerga. Foi um trabalho complexo, todo o mercado financeiro envolvido, internacional também, até o Banco Central do Paraguai. E o nosso.

PALMÉRIO DÓRIA: O maior vazador de grana do Brasil.

PROTÓGENES: A maior lavanderia se instalou ali, e com apoio político. Começamos a escanear todo aquele processo, identificando os atores.


PALMÉRIO DÓRIA: Estamos prontos para falar da Satiagraha? Como ela sai do mensalão e vira o que virou?

PROTÓGENES: A origem não é mensalão, é Operação Chacal. A investigação da Parmalat, envolvida em fraude na Itália e no Brasil. Lavagem de dinheiro, evasão de divisas. Investigação presidida pelo delegado Elpídio Nogueira. Ele monta uma estação de trabalho em São Paulo, em 2003, 2004. O Elpídio entra em parafuso, vai para tratamento. E o doutor Paulo [Lacerda, ex-chefe da PF] decidiu ficar em cima da Kroll, junto com a Parmalat, a que a Kroll prestava serviço. E descobre que a Kroll é uma empresa americana de espionagem. Uma estação privada da CIA aqui. Esse volume de dados vai para a diretoria de inteligência, e descobrimos que a Kroll seria também um braço de espionagem que servia ao grupo Opportunity, à BrasilTelecom. E nasce uma operação para investigar a Kroll. A Operação Chacal.

MARCOS ZIBORDI: Daí sai o HD do Oppotunity, na verdade cinco.

PROTÓGENES: Não. É um. Ele depois é copiado. Na Chacal, vem junto o grupo Opportunity do Daniel Dantas. Ele usa a Kroll para espionar adversários dele.

WAGNER NABUCO: Gente do governo?

PROTÓGENES: Sim. Gushiken, ministro da Comunicação, o ex-chefe da Casa Civil José Dirceu, presidentes de banco, Fundos de Pensão, Banco Central, Banco do Brasil, ministros... Pra que possa ter um dossiê de todas essas pessoas. Quando a Chacal chegou no Opportunity é que apreende um HD. Estava ligado ao desktop ligado ao banco. Tipo 160 gigas de memória. O juiz determina a apreensão, e quando chega a Brasília já tem um grupo de advogados com decisão judicial para lacrar. O Ministério Público recorre e vai ao TRF [Tribunal Regional Federal] e me parece que o TRF determina que se abra o HD. Aí o Opportunity vai ao STF [Supremo Tribunal Federal] e o STF determina que se lacre.

PALMÉRIO DÓRIA: Ellen Gracie?

PROTÓGENES: Ministra Ellen Gracie. Uma decisão oportunista. O que é que pode ter um HD que a Justiça não possa conhecer, a polícia? E fica uns dois anos parada a investigação. Aí surge o mensalão. Tudo no País, as grandes fraudes, podem ter certeza que não são visíveis de imediato. Mas vai ser visível. A mentira perdura pouco. A verdade é eterna. Igual ao caso Maluf. Com um pedido vagando no espaço, de quebra de sigilo, três anos, e veio tudo. O suficiente para o povo conhecer que houve desvio de dinheiro público, corrupção.
RENATO POMPEU: E ele sumir politicamente.

PROTÓGENES: Esperamos. E, depois do regime militar, foram com muita sede, não de resolver o problema político, mas de se sustentar no poder, e muita sede de se apropriar dos recursos públicos. Muita sede de dinheiro. Estamos presenciando uma construção de valores muito baixa. E se sustenta porque a sociedade parece hipócrita, idiota. Pode parecer, mas não é! Chega um momento que vai exigir. As autoridades honestas, que têm compromisso com essa sociedade, vão fazer valer seu exercício.

RENATO POMPEU: Estávamos na Operação Chacal.

PROTÓGENES: Como é que deslacra o HD? É um país de escândalos, vamos esperar o próximo e vamos abrir o HD. E vem o mensalão. Parte de um grupo pequeno, eles se revezam no poder. Coisa absurda! Não vê agora? Acaba uma eleição municipal e o Lula vai lá sentar com o Serra. Sorrindo, de braço dado.

FERNANDO LAVIERI: Um ato político.

PROTÓGENES: Tem que se conversar com todo o mundo. Mas ali, para mim, é uma ironia com nós eleitores. Com o povo! Vai me desculpar, um desrespeito! Não me sinto feliz em ver aquela cena não! Tipo "você está perdendo o poder, estou ganhando, mas vou te segurar". Todo o mundo com sorriso irônico, Sérgio Cabral, Serra, Aécio, Hartung, o que é isso? Mas então, abrimos o HD. As personagens são as mesmas. Encontramos os doleiros do mensalão, que servem ao Daniel Dantas, ao Naji Nahas.
WAGNER NABUCO: E que serviram em Minas o Marcos Valério?

PROTÓGENES: Marcos Valério. Eduardo Azeredo. Nasce a Satiagraha. Que poderia ser melhor, já pensou? Satiagraha depois das eleições? Que vitória para o país! Só que muita gente teria que se mudar daqui. E é aberto o HD numa estratégia do Ministério Público e Polícia Federal, em que é provocado o juiz de primeira instância: o ministro Joaquim Barbosa [STF] manda expedientes para vários Estados para complementar a diligência e a ação judicial que tramitava no Supremo, em que ele era relator. A rigor, ele deveria concentrar no Supremo, mas, para otimizar o processo, inteligentemente descentraliza a ação junto a juizes de primeiro grau. Aí, conseguimos provocar a Justiça, e tinha doleiros ali que tinham relação com o Opportunity já no caso Banestado, lá atrás, desde 1997. E conseguimos uma decisão judicial para que a juíza deslacrasse o HD e permitisse que a Polícia Federal verificasse se tinha algum dado que importasse em crime financeiro envolvendo pessoas do mensalão. Encontramos um volume de dados muito grande e a juíza deu um prazo exíguo para exame, e nós, em trinta dias, identificamos que não tinha, a princípio, nenhum mensaleiro ali, mas um volume de dados que dava conta de uma série de indícios de crime financeiro e lavagem de dinheiro envolvendo muita gente, pessoas físicas e jurídicas.

RENATO POMPEU: A impressão é que o senhor esteve o tempo inteiro investigando o mesmo polvo, cada hora pegando um tentáculo, e um dia vai chegar na cabeça.

PROTÓGENES: Raciocínio perfeito. Sempre cheguei na cabeça, ó não deu pra pegar. Tem a dívida externa, que é a coisa mais nojenta que já vi. Aquilo tinha que ser batido e rebatido, sabe? E quem participou está hoje aí. Foi presidente.

FERNANDO LAVIERI: Conta.
PALMÉRIO DÓRIA: Você está falando do Fernando Henrique Cardoso?
PROTÓGENES: Fernando Henrique Cardoso.

PALMÉRIO DÓRIA: Você está falando do Paribas, de como o presidente manipulou e ganhou com isso?

PROTÓGENES: Exatamente. Nossa dívida externa é artificial e eu provei isso na investigação. Houve repulsa minha porque quando era estudante empunhei muita bandeira "Fora FMI", "Nós não devemos isso".

MYLTON SEVERIANO: "A dívida já está paga".

PROTÓGENES: "A dívida já está paga". E foi muito jato d"água, muita cacetada, muito gás lacrimogêneo, "bando de doido, tem que tomar porrada, pau nesses garotos". Você cresce achando que era um idiota, não é? Chega um momento que pensa "a dívida foi criada no regime militar, mas a gente precisa pagar".

FERNANDO LAVIERI: Como você provou isso?
PALMÉRIO DÓRIA: O jogo começou a ser jogado no Ministério da Fazenda?

PROTÓGENES: Sim. Querem essa história?

TODOS: Sim!

PROTÓGENES: Vocês não vão dormir direito. Isso é para maiores de 50 anos. Estamos em 2002, me atravessa as mãos o expediente para um banco francês, "esse banco eu conheço, é sério". E a suspeita que investigo é fraude com títulos públicos brasileiros, negociados no mercado internacional, títulos da dívida externa. Negociados na década de 1980: o que chama atenção?

MYLTON SEVERIANO: Fim da ditadura.

PROTÓGENES: E transição para o regime civil. José Sarney pega o país em frangalhos, devendo até a alma, sem dinheiro para financiar as contas públicas, muito menos honrar compromissos, a famigerada dívida com o FMI. Havia até o "decrete-se a moratória". Era o papo nosso, da esquerda, dos estudantes, "não vamos pagar, já levaram tudo". E o Sarney, o que faz? Bota a mão na manivela e nossos títulos da dívida externa valiam, no mercado internacional, no máximo 20% do valor de face, era negociado na bolsa de Nova York. No paralelo valiam 1%. O que significa? Não passa pela bolsa. Comprei, quero me livrar, então 1% do valor de face, título de um país "à beira de uma convulsão social, ninguém sabe o que vai acontecer com aquele país, um conjunto de raças da pior espécie": essa, a visão primeiro-mundista, o que representávamos para os banqueiros. Escória. E aqui estávamos, discutindo a reconstrução do país. Vamos dialogar, botar os partidos para funcionar, eleições, e o Sarney tendo que dar uma solução. Fecha a manivela e toca a jogar título no mercado de Nova York. Cada título que valia 10%, 15%, mandava dinheiro aqui para dentro. Seis anos depois, o mercado financeiro internacional detectou que no Brasil haveria desordem, até guerra civil, e eles não iam receber o que tinham colocado aqui com a compra dos papéis podres, queriam receber mesmo os 15%. E fazem uma regrinha de três e colocam para o Banco Central: “Você vai instituir uma norma, os títulos da dívida externa brasileira adquiridos no mercado financeiro internacional, no nacional poderão ser convertidos junto ao Banco Central pelo valor de face desde que esse dinheiro seja investido em empresas brasileiras." Bacana, não? Se funcionasse como ficou estabelecido, nosso país seria uma potência, não? Ainda que uma norma perfeita, acho um critério não normal, não é? Não é moralmente ético eu comprar um título por 15% e ter um lucro de 100%, em tão pouco tempo. Mas enquanto regra de mercado financeiro tenho de admitir que sou devedor. Se vendi a 15%, na bolsa, assumi o risco de, no futuro, o lucro ser maior para o credor. Tenho que pagar. Foi assim que foi feito? Não.
Será que o grupo Votorantim recebeu algum dinheiro convertido? Alguma outra empresa nacional do porte recebeu? Não. O que o sistema montou? Uma grande operação em determinado período para sangrar as reservas do país, e ainda tinha as cartas de intenção, que diziam "se você não me pagar posso explorar o subsolo de 50 mil quilômetros da Amazônia".

WAGNER NABUCO: Era a fiança?

PROTÓGENES: Sim. Então me deparo com um banco, o Paribas, hoje BNP-Paribas que se uniu ao National de Paris. Com três diretores, em São Paulo, e dois outros, mais um contador que foi assassinado e um laranja que se chamava Alberto. O banco adquire esses títulos, no valor de 20 milhões de dólares, não é? E converte no Banco Central e aplica em empresas brasileiras, empresas-laranja. Comprou no paralelo a 1%, eram 200 mil dólares, e converteu a 20 milhões de dólares aqui no Brasil e colocou nessa empresa-laranja...

Quase que o prendi. Tinha um fato para poder prendê-lo, mas iria criar uma crise. Já tinha manifestação em frente ao Supremo Tribunal Federal, membros dos três poderes um acusando o outro, determinado grupo político querendo criar uma nova situação, um passo atrás.
Fernando Lavieri — Mas não seria bom uma virada de mesa?
Não. Eu não sou da teoria de quanto pior melhor. Para mim, quanto pior, pior. Esse quanto pior melhor eu aprendi com 14, 15 anos. Hoje vivemos no século 21: quanto pior, pior.


PROTÓGENES: De participações. Chamava-se Alberto Participações, com capital social de 10 mil reais. Já tem coisa errada. Como uma empresa com capital de 10 mil reais pode receber um investimento estrangeiro da ordem de 20 milhões? Cadê o patrimônio da empresa? Como é que o Banco Central aprova? Mando pegar o processo. Ela investiu, vamos ver aonde o dinheiro vai. Converteu os 20 milhões e ao longo de doze meses o dinheiro é sacado mensalmente na boca do caixa em uma conta e convertido no dólar paralelo e enviado para a matriz em Paris. Eu digo "Banco Central, me dá o processo do Paribas". Aí não consigo, quem consegue é o procurador que trabalhava comigo, Luiz Francisco. Consegue e remete pra mim em São Paulo. Vejo que no Banco Central houve uma briga interna pela conversão. Os técnicos se indignaram, e indeferiram. Ai houve uma gestão forte para que houvesse a conversão. De quem? Do ministro da fazenda. Que era quem?

MYLTON SEVERIANO: Fernando.

MARCOS ZIBORDI: Henrique.

MYLTON SEVERIANO: Cardoso.

PROTÓGENES: Tento localizar os banqueiros. Todos fugiram. Os franceses todos. O
contador, assassinado. O laranja Alberto morreu de morte natural, assim falam no Líbano, onde ele morreu. E me sobra a sócia dele, uma senhora chamada Célia. Morava na Avenida São Luís. Ah, é? Um foi embora, outro fugiu, outro morreu, outro foi assassinado: querem brincar com a Polícia Federal? Com a dívida externa do Brasil? Descubro essa sem-vergonhice, essa patranha, essa picaretagem de fundo de quintal que acontecia enquanto nós estudantes lutávamos, dizíamos que a dívida externa não existia, e, de fato, parte dela era artificial. A coisa é grave, vamos fazer uma continha, nós contribuintes, que cremos que existe uma ordem no país. Títulos que adquiri por 200 mil, converti no Brasil os 20 milhões de dólares, quanto tive de lucro? 19 milhões e 800 mil. Vamos fazer essa continha para vocês dormir direito hoje. Esses 19 milhões mandei para minha matriz, o papel está na minha mão ainda, porque dizia o seguinte a norma do Banco Central: ao converter esse título, invista em empresa brasileira, e ao final de doze anos "Brasil, mostre a sua cara e me pague aqui, você me deve, pois sou credor dessa nota promissória chamada título da dívida externa brasileira". Está na lei. Bota aí. Soma 20 milhões com 19 milhões e 800 mil: 39 milhões e 800 mil. Nós devemos isso aí? E mais, o que pedi? Que o juiz bloqueasse o título do Paribas, não pagasse, indiciei os diretores. Por quê? Porque estava se aproximando o final dos doze anos, o título estava vencendo e tínhamos que pagar. Pedi que o Banco Central enviasse cópia de todos os processos de conversão da dívida externa brasileira pra mim. Estou esperando até hoje. Sabe o que o Banco Central falou? "O departamento não existe, nunca existiu, era feito por uma seção aleatoriamente lá no Banco Central." Então nós não devemos esse montante de milhões que cobram.
RENATO POMPEU: Só não entendi o que o Fernando Henrique Cardoso ganhou com isso. Calma, calma. Sobrou uma para contar a história. A Célia da Avenida São Luís. A mulher de verdade. Era companheira do Alberto, exembaixador do Brasil no Líbano. Quando estourou a guerra ele fugiu e viveu na França, estudando na Sorbonne. Quem ele conhece lá?
MYLTON SEVERIANO: Fernandinho.

PROTÓGENES: Colegas de faculdade. A Célia, marquei depoimento numa quinta, véspera de feriado, às seis da tarde na superintendência da Polícia Federal. Uma morena bonita, quase 60 anos, me disse que tinha sido miss, modelo, era sócia nessa empresa, tinha tipo 1%. Furiosa, "que absurdo, véspera de feriado, perder meus negócios, engarrafamento". Já estava gritando no corredor. Dei um molho de uns trinta minutos até ela se acalmar. Pensei "essa mulher está furiosa e tem culpa no cartório". Falei "obrigado por ter vindo", e ela "obrigado nada, o senhor é indelicado, desumano, sou dona de uma indústria de sorvetes, e me chama numa hora importante porque tenho que distribuir sorvete, é feriado, o senhor não tem coração". No meio da esculhambação, digo "tenho que cumprir meu dever, sou funcionário público", e ela "aposto que é o caso daquele Paribas, não sei por que ficam me chamando, e tem mais, fui companheira do Alberto, e ele foi muito mais brasileiro que muita gente. Era digno, honesto, ficam manchando a alma dele. Eu ajudei ele até o fim da vida, inclusive sustentei parte da família dele". Percebi que não sabia a verdade, ela disse "ele morreu pobre, ficou esperando a conversão dessa dívida que nunca houve". Detalhe: na quebra de sigilo bancário encontrei um cheque do Alberto que ele recebeu, 64 milhões, na boca do caixa do banco Safra. E ele transfere as cotas para uma empresa criada pelo Paribas em nome dos diretores.

MYLTON SEVERIANO: No Brasil?

PROTÓGENES: Já é um Paribas do Brasil. Transfere para a subsidiária, e os diretores começam a sacar. O primeiro que recebe é ele, valor equivalente a 5%. E ela disse "ele não recebeu a comissão dele que era de 5%". Bateu! Tranquei o gabinete, falei "vou mostrar um documento, mas se disser que mostrei, prendo a senhora", era a cópia do cheque, com assinatura e data. A mulher começou a chorar. "Desgraçado. Que o inferno o acolha!" Ela disse "tenho muito documento na minha casa". Se fizesse pedido de busca e apreensão chamaria atenção da Justiça, teria um indeferimento. Essa investigação estava sendo arrastada. Fiz uma busca e apreensão ao inverso, "a senhora permite que selecione o que quero?", ela disse "perfeito". Naquela véspera de feriado, peguei dois agentes, contrariando colegas que queriam ir embora...
MYLTON SEVERIANO: Qual o ano?

PROTÓGENES: 2002. Saímos de lá de madrugada, era um apartamento antigo, magnífico. Ela chorando, "desgraçado, até comida na boca eu dei". Ela me dá uma agenda, "aqui parecia o Banco Central, eu atendia o doutor Alberto, da área internacional". Encontrei documentos, agendas que vinculavam ele ao Armínio Fraga, ao Fernando Henrique, inclusive uma carta manuscrita, não vou falar de quem, depois confirmada, ela falou "levei esse presente, pessoalmente, até a casa do Fernando". Mandei documentos para perícia. Na época era eleição do Fernando Henrique.

RENATO POMPEU: Não, do Lula.

PROTÓGENES: Isso. Lula venceu contra Serra. Fernando Henrique era presidente.

RENATO POMPEU: Ele recebeu dinheiro então?

PROTÓGENES: Vamos pegar a linha do tempo. Ele sai de ministro da Fazenda e vira presidente. O gerente da área internacional que dá o parecer no processo, quem era? Armínio Fraga. Que presidiu o Banco Central. Essa investigação não sei que fim deu. Pedi ao Banco Central o bloqueio de todos os títulos da dívida externa brasileira que foram convertidos. E pedi cópia de todos os processos de conversão junto ao Banco Central para investigação.

RENATO POMPEU: Saiu na mídia?

PROTÓGENES: Em parte, mas foi abafado. Quem conseguiu publicar foi, se não me engano, a Época.

PALMÉRIO DÓRIA: Citando Fernando Henrique?

PROTÓGENES: Não, não citou. A reportagem era "Fraude à francesa". Essa investigação surge da denúncia de um advogado, Marcos Davi de Figueiredo. Ele sofre uma pressão implacável dentro do banco. A Célia passa a ser ameaçada, logo que presta depoimento entregando tudo. Inclusive os escritórios que deram suporte a essa operação, um do Pinheiro Neto, e ela diz que sofria ameaça do próprio Pinheiro Neto. O procurador foi o doutor Kleber Uemura.

MARCOS ZIBORDI: É a última notícia?

PROTÓGENES: Sim. Parece que ele tinha conseguido a quebra de sigilo bancário. Depois o dinheiro saiu no mercado paralelo e entraram grandes empresas com esquemas de saída de dinheiro. Tinha a Cotia Trading, que tinha uma coisa com a Volkswagen. Entra gente muito poderosa no esquema. Pedi a quebra de sigilo de todas as pessoas que participaram da fraude. E o Kleber conseguiu, aí não acompanhei mais. O Tribunal Federal deu a decisão de que era para não ter quebra de sigilo, era a juíza, salvo engano, Sylvia Steiner. Dá decisão favorável ao banco. Meses depois é nomeada juíza do Tribunal Penal Internacional pelo...
RENATO POMPEU: ...excelentíssimo presidente da República.

MYLTON SEVERIANO: Que história, hein?

PALMÉRIO DÓRIA: Vamos para a Satiagraha?

PROTÓGENES: Quer chegar lá? É muita picaretagem. E feito por uma minoria e estão aí de braço dado. Se você bater de frente é uma força desigual. É quebrada uma conta estratégica. Vislumbramos indício de crimes financeiros. A juíza tinha que determinar a abertura de nova investigação.

MARCOS ZIBORDI: Esse pedido não é feito pelo senhor.

PROTÓGENES: Exatamente: polícia chamava atenção. Então, Ministério Público. Passamos a analisar aquele HD. Começam a se estruturar dois grupos de trabalho, um em torno do delegado Elzio Vicente. Começo a sobrecarregá-lo com demandas, ele não suporta, investigar o Daniel Dantas é coisa pesada. E ele se apresenta para o senhor Paulo e diz "não estou conseguindo acompanhar o Queiroz". Fico só com a investigação, com uma condição, que o doutor Paulo ficasse até o final do governo Lula. Digo: "Por uma razão: se o senhor não ficar, essa investigação para." Ele disse "tenho compromisso com o presidente de permanecer". Eu disse"essa investigação para no dia seguinte que o senhor sair". É complexa a capilaridade que o Daniel Dantas tem ao longo desses 20 anos, desde o Fernando Henrique. Só para terem noção, ele tem uma empresa de exploração de mineração, MG4, que tem mil concessões deexploração de solo urbano. É necessário você ter uma força muito grande dentro do governo. Eles já estavam ofertando a empresa lá fora, no Oriente Médio. O intermediário era o Naji Nahas. Isso significa vender nosso país in natura.
“No STJ estava tranquilo. Estruturamos a segunda prisão. Mas não pensávamos que o STF iria contrariar a opinião pública, todas as regras jurídicas, todas as processuais.”

FERNANDO LAVIERI: Não basta poder financeiro, tem que ter poder político.

PROTÓGENES: Exatamente. Ele tem muita gente na mão. E prenuncia, a todo tempo, que se acontecer qualquer coisa com ele, ele fala. Uma pessoa falou: "Protógenes, se o Daniel Dantas falar, eu prefiro que ele fique preso."

PALMÉRIO DÓRIA: Houve um momento em que ele disse "vou falar"?

PROTÓGENES: Ele disse que ia falar quando da segunda prisão. Tinha certeza que iria ser solto.

WAGNER NABUCO: Você imaginava que seria solto?

PROTÓGENES: Sim, mas não tão rápido.

PALMÉRIO DÓRIA: Até porque tinha gravado que "lá em cima" ele resolvia.

PROTÓGENES: Exatamente. No STJ estava tranquilo. Estruturamos a segunda prisão. Mas não pensávamos que o STF iria contrariar toda a opinião pública, todas as regras jurídicas, todas as normas processuais.

MYLTON SEVERIANO: Vocês não esperavam que ele pudesse ter tanta força política?

PROTÓGENES: Não. E é um poder sem precedentes. Foram sucessivos atos que dão conta de que ele é uma pessoa muito poderosa e que esse poder viria com uma velocidade e uma força que se moveria contra quem quer se opusesse a esse grupo.

PALMÉRIO DÓRIA: Não era marolinha, era tsunami.

PROTÓGENES: Tsunami. E era o poder de um grupo. Ele representa um grupo, interesses, determinado segmento bem solidificado durante a redemocratização, que construiu um poder criminoso. Seria o PC [Paulo César Farias, homem forte de Fernando Collor] que deu certo.

WAGNER NABUCO: Na segunda prisão você disse que ele abriria o jogo.

PROTÓGENES: Estávamos indo na viatura. Ele me fala olhando com respeito. Muita
frieza. Ele é frio. No início a mídia foi avassaladora contra, com velocidade, peso nas manchetes. Eu tinha falado "o senhor tem a grande mídia nas mãos, porque financia; agora, não use contra esse trabalho, nem contra mim, porque um dia pode se voltar contra o senhor. A grande mídia pode fomentar mentira por alguns dias, mas uma hora a opinião pública fica saturada. Isso um dia para".
Ele pergunta se tenho prova e digo "sim, está na investigação". Ele: "O senhor está enganado, eu não financio." Com frieza, calma. Na segunda prisão peguei os periódicos e coloquei em cima da mesa. Tinha um jornal, ou revista, que publicou matéria contra ele e coloquei no meio. Ele entrou, olhou a mesa de jornais. Quando identificou aquela lá, pergunta: "Quem é que fabricou isso aqui?" Aí ele confessou. Eu certo a estratégia. Mas não vou dizer quem fez a matéria.

PALMÉRIO DÓRIA: A política chegou a ponto tal, de repente você votou no Lula, e batendo boca com o governo. Não só votei no Lula como ajudei na construção do partido dele no Rio.

PALMÉRIO DÓRIA: De repente ele batendo boca com você.

PROTÓGENES: O primeiro sentimento foi o de servidor público, teria que cumprir uma ordem presidencial. E me otimizei para concluir a investigação, e consegui a primeira parte. Diz respeito ao crime de corrupção ativa, e de gestão fraudulenta, salvo engano por corrupção ativa que vai ser condenado.

MYLTON SEVERIANO: Mas não ficou para a opinião pública que você foi afastado?

PROTÓGENES: Esse é o meu sentimento como servidor público. Ele pediu que entregasse o relatório de forma pública. E externei meu sentimento como cidadão. Se vocês pararem nas minhas primeiras declarações, quando entrego o relatório, lembro como cidadão dos meus primeiros passos na democracia, lembrar de quando estava na Diretas-Já, tava no palanque desde Fernando Henrique até o presidente Lula, com Brizola, Ulysses Guimarães. O saudoso Tancredo Neves fez falta e ainda faz. E eu tô lá. Todo o mundo ovacionado, aqueles discursos, e o que mais me chamou atenção foi o Sobral Pinto -que leva o nome na minha turma de Direito -, o discurso dele se resume a uma frase: "No Brasil, o que mais temos que respeitar é o artigo 1o da Constituição Federal do Brasil: Todo poder emana do povo e em seu nome será exercido." Acabou. Então, externei, como cidadão, que o poder vinha do povo. E eu tava obedecendo ao presidente, mas originariamente ao povo, que estava esperando minha conduta.
WAGNER NABUCO: Você conhece o Lula?

PROTÓGENES: Eu o cumprimentei uma vez, no gabinete, num evento. Tive impressão de pessoa honesta, correta, origem humilde, e externa esse sentimento, chegou como chefe de uma importante nação com apoio popular. Mas durante a gestão, a grande dificuldade seria, nós estranhamos, em determinadas composições políticas, posturas, mesmo companheiros que traíram aqueles propósitos originais da causa operária, da causa social, de apoio aos movimentos sociais, de retribuição de todo aquele conhecimento que tinha do passado, de aplicar isso no presente.
PALMÉRIO DÓRIA: Engraçado, muitos desses companheiros são homens do Dantas hoje.

PROTÓGENES: Não diria homens do Dantas.

PALMÉRIO DÓRIA: Do poder, e próximos dele.

PROTÓGENES: Homens do poder, e não só do Dantas. Daniel Dantas representa um poder ainda invisível. É visível à medida que começamos a aprofundar a investigação. Ou até num debate público, ai as pessoas começam a se revelar. Marx dizia "os quadros da sociedade começam a se revelar através de um processo público em que as pessoas se posicionam". Alguns com um ideai, outros com outro ideal. Às vezes me dizem "estão criticando a Satiagraha, a verdade é que foi um sucesso, pautou-se pela lei, pelas regras do direito penal brasileiro, pela Lei de Crimes Contra o Sistema Financeiro Brasileiro. Tanto que vamos ter uma condenação em breve. Significa que o resultado das investigações foi legal.

PALMÉRIO DÓRIA: A gente vê tentativas pra desautorizar. A Veja inventou o grampo telefônico sem áudio. A outra é você ter apelado para a Abin.

PROTÓGENES: Por que o auxílio da Abin? Eu estava fragilizado em recursos humanos, com uma operação gigantesca dessa precisaria uns 50 policiais. Me deixaram com cinco. Sobraram quatro até deflagrar a operação. Pensei que fosse uma situação de transição de um diretor para outro, depois percebi que não, era uma orquestração para me tirar todo suporte, para paralisar a operação. Você quer aniquilar o inimigo, acabe com seu suprimento, até pão com manteiga. Falei "tenho que ultrapassar esse obstáculo". Recorri ao sistema ao qual pertenço, Sistema Brasileiro de Inteligência.

MYLTON SEVERIANO: Achou um flanco legal.

PROTÓGENES: Sim. Tá em lei. Aqui [tira da bolsa a lei 9.883/99, para ler o parágrafo 2o do decreto 4.366/02, que a regulamenta]. Eles fazem a polêmica e não falam da lei. Não mostram à população. Numa simples leitura você entende:

"O Sistema Brasileiro de Inteligência é responsável pelo processo de obtenção e análise de dados e informações, e pela produção e difusão de conhecimento necessário do processo decisório do Poder Executivo e em especial no tocante à segurança da sociedade e do Estado, bem como à salvaguarda de assuntos sigilosos do interesse nacional."

A Operação Satiagraha está mais para a segurança de Estado que pra sociedade. É para os dois, um misto. O que é o processo de obtenção e análise de informações? Vigilância eletrônica, convencional, ou seja, fotografar, filmar, gravar, investigar. Constituem o Sistema Brasileiro de Inteligência: Ministério da Justiça, por meio da Secretaria Nacional de Segurança Pública; Departamento de Polícia Rodoviária Federal; e Coordenação de Inteligência da Polícia Federal. Hoje não é mais Coordenação, é Diretoria. Quem pertence? O Protógenes. Então eu estava autorizado por lei a chamar os colegas da Abin. Além disso, a rotina é trocar informações com outros órgãos, inteligência militar: Marinha, Exército, Aeronáutica; Abin, Receita Federal. Até um simples telefonema -uma rasurada num papel de pão, nós consideramos uma informação.

BRUNO VERSOLATO: Há uma informação que um emissário ou assistente do Gilmar Mendes [ministro e atual presidente do Supremo Tribunal Federal] jantou com um advogado do Dantas num restaurante japonês em Brasília. Na véspera da decisão do habeas corpus. Houve esse jantar?

PROTÓGENES: O fato está sendo investigado pelo Ministério Público federal, não posso fornecer informações.

RENATO POMPEU: Entendi mal ou é possível elaborar uma lista de jornalistas que
receberam dinheiro de Daniel Dantas?

PROTÓGENES: Não diria que receberam, na investigação aparecem alguns. Não preciso mencionar, está nos relatórios.

RENATO POMPEU: O relatório remete para um anexo. E não tivemos acesso. Você tem uma rede de jornalistas que abasteciam Daniel Dantas ou faziam manifestação de mídia a favor dele, favoreciam negócios dele no presente, ou até mesmo projetos futuros.

RENATO POMPEU: Nós podemos ter acesso a esse documento? A lei permite, não?

PROTÓGENES: Acredito que logo isso vai vir a público. Entendo que o Congresso tem que rever isso. Que o Supremo deveria liberar esses dados, ali estão nossos representantes. O povo tem que conhecer, não são dados privados. São públicos, mexeu com recurso público, com nosso dinheiro. Não quero saber justamente dos dados da vida privada da pessoa. Isso tem que ser preservado, a intimidade. Agora, onde tem fraude, temos que conhecer. Acho que vocês da imprensa têm um grande papel. Bater: o dado que tenha fraude, desvio de recurso público, embora captados em investigação sigilosa, temos que reverter, têm que ser de conhecimento público.
PALMÉRIO DÓRIA: A bancada do Dantas compreende quantos deputados, senadores?

PROTÓGENES: O termômetro da bancada do Daniel Dantas no Congresso é o comportamento dessesparlamentares no caso Satiagraha. É só ir atrás. Era legal vocês da mídia fazerem um placar. Deputado tal se manifestou. Marca um xis. E na eleição botar elegermos esse povo novamente. Para a cadeia ele VAI. Condenado. Em um primeiro momento. Agora, mantê-lo na cadeia depende de nós.”

AMANCIO CHIODI: As polícias estaduais reclamam que prendem e os juizes soltam. Na instância federal também é assim?

PROTÓGENES: Não culpo assim, a polícia prende e a Justiça solta. Às vezes, um acusado é solto por deficiência legislativa. As nossas leis processuais protegem o bandido!

WAGNER NABUCO: O Dantas pode sair ileso? Ou ir para a cadeia?

PROTÓGENES: Para a cadeia ele vai. Condenado. Em um primeiro momento. Agora,
mantê-lo na cadeia depende de nós. Depende do povo.

MARCOS ZIBORDI: Não depende do judiciário?

PROTÓGENES: Não. No judiciário ele sai no dia seguinte.

MYLTON SEVERIANO: O que você sentiu quando ele saiu livre duas vezes em menos de 48 horas?

PROTÓGENES: Senti vontade de prendê-lo a terceira vez.Quase que o prendi. Tinha um fato para poder prendê-lo, mas iria criar uma crise. Já tinha manifestação em frente ao Supremo Tribunal Federal, membros dos três poderes um acusando o outro, determinado grupo político querendo criar uma nova situação, um passo atrás.

FERNANDO LAVIERI: Mas não seria bom uma virada de mesa?

PROTÓGENES: Não. Eu não sou da teoria de quanto pior melhor. Para mim, quanto pior, pior. Esse quanto pior melhor eu aprendi com 14, 15 anos. Hoje vivemos no século 21: quanto pior, pior.

 

Comente esta notícia


Reportagem Especial LEIA MAIS