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Vedação à comunicação automática de crimes tributários e a evolução da Representação Fiscal para Fins Penais

Por Giovanna Guerra*

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A Representação Fiscal para Fins Penais é um ato administrativo de comunicação entre o procedimento tributário e o futuro procedimento investigativo-criminal. Trata-se de um documento produzido pelas autoridades fiscais, encaminhado ao Ministério Público e no qual se relata a identificação de fatos que podem configurar crimes contra a ordem tributária, contra a previdência social, crime de contrabando ou de descaminho (vide art. 2º da Portaria RFB nº 1750, de 12 de novembro de 2018). Portanto, o objetivo desse ato é comunicar ao Ministério Público a possível ocorrência de ilícito penal tributário.

Esse documento deverá conter a identificação das pessoas a quem se atribua a prática do delito penal, a descrição dos fatos, o enquadramento legal, a identificação das testemunhas, dentre outras informações. Esses elementos facilitam a identificação da autoria do crime, tornando possível que sócios e administradores figurem como réus em uma ação penal.

Ademais, a Representação Fiscal para Fins Penais desempenha papel relevante na demonstração da materialidade do crime em potencial, uma vez que, para que seja considerada válida, deve estar instruída com a documentação comprobatória pertinente, qual seja: (i) auto de infração ou notificação de lançamento; (ii) cópia do contrato social ou do estatuto social da pessoa jurídica autuada, do período fiscalizado até a última alteração; (iii) declarações ou escriturações apresentadas à Receita Federal Brasileira relacionadas ao lançamento; (iv) termos lavrados na ação fiscal de que resultou o lançamento, especialmente referentes a depoimentos, declarações, diligências e perícias; e (v) documentos com indícios de irregularidades apreendidos no curso da ação fiscal.

A Representação Fiscal para Fins Penais, portanto, é um documento essencial e imprescindível para o início das investigações criminais. Há alguns anos, entretanto, essa transmissão de informação pelas autoridades fiscais acerca de possível ocorrência de crimes estava sendo banalizada, já que muitos Auditores Fiscais formalizavam a Representação Fiscal para Fins Penais apenas com base na existência de dívidas em aberto, sem verificar se essas dívidas realmente se relacionariam com algum tipo de fraude ou intenção ilícita.

A sobrecarga inócua no Poder Judiciário, decorrente desses encaminhamentos automáticos, provocou a edição da Portaria RFB nº 199/2022, que promoveu relevante alteração legislativa ao condicionar a formalização da representação à comprovação de indícios concretos de materialidade delitiva, afastando a possibilidade de que meros erros na transmissão das informações à base de dados da Receita Federal Brasileira fossem indevidamente interpretados como crimes contra a ordem tributária.

Essa alteração legislativa proporcionou maior efetividade às ações penais-tributárias, afinal, é comum que o contribuinte cometa equívocos no envio de dados e informações ao Fisco sem que haja qualquer intenção ilícita subjacente a esse erro. A norma passou a estabelecer que a Representação Fiscal para Fins Penais somente poderá ser formalizada diante da existência de elementos concretos e suficientes que indiquem a prática de crime contra a ordem tributária, afastando, assim, a possibilidade de que simples falhas materiais ou meros inadimplementos sejam encaminhados ao Ministério Público como indícios de prática delitiva.


*Giovanna Guerra
Advogada criminalista especializada em crime econômico, bancário, tributário e ambiental, e sócia da banca João Domingos Advogados

 

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