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Educação Domingo, 29 de Junho de 2025, 12:48 - A | A

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Comportamento

Além das telas: proibição do celular transforma rotina nas escolas

Reportagem mostra impactos da lei federal em Campo Grande, com retorno de brincadeiras e desafios da abstinência digital entre estudantes

Vivianne Nunes
Capital News

Seis meses após a entrada em vigor da Lei Federal 15.100/2025, que proibiu o uso de celulares durante as aulas e intervalos nas escolas públicas e privadas do país, os efeitos da medida começam a ser sentidos de maneira prática no cotidiano escolar. Em Campo Grande, o cenário é de resgate de brincadeiras, aumento na socialização e até retorno de itens antes esquecidos, como câmeras fotográficas, mas também de resistência, ansiedade e adaptações por parte dos alunos.

Divulgação

Além das telas: proibição do celular transforma rotina nas escolas

Diretor Wilson Buzinaro avalia positivamente a retirada dos smartphones

No colégio Elite Mace, por exemplo, a turma do terceiro ano do ensino médio reencontrou na máquina fotográfica um substituto para os registros do último ano escolar. “As máquinas fotográficas voltaram. É muito interessante isso aí. Surgiram do nada”, contou o diretor Wilson Buzinaro. Ele avalia que a retirada dos celulares evidenciou que, embora tenham sua importância, os aparelhos estavam comprometendo o ambiente escolar. “Não é em si a proibição, mas o que estava se provocando com o uso em demasia”, explica.

Buzinaro também relatou que o ambiente ficou mais leve e interativo. Brincadeiras como pular corda, jogar pingue-pongue e tocar violão voltaram a fazer parte do recreio. “Eles entenderam que o celular tem seu valor, mas não pode ocupar todo o espaço. Resgataram a câmera como ferramenta de memória e passaram a viver mais intensamente os momentos que querem guardar”, disse. A socialização melhorou, com mais conversas e contato visual. “Os jovens estavam se afastando um do outro, se isolando. Agora há mais proximidade, mais trocas.”

Apesar dos benefícios, Buzinaro pondera que o celular, quando bem orientado, também é uma ferramenta de aprendizagem. “O que precisamos é ensinar o uso equilibrado”, conclui.

Divulgação

Além das telas: proibição do celular transforma rotina nas escolas

Hélio Daher lista pontos positivos da Lei

Na rede estadual, a medida também foi bem recebida. Segundo o secretário de Educação do Estado, Hélio Daher, o balanço é positivo. “Era necessário esse tipo de intervenção, não só na questão de melhorar a aprendizagem, como também de possibilitar uma melhor socialização entre os estudantes”, avalia. Ele destaca o retorno de jogos de tabuleiro, conversas e momentos de lazer coletivo, especialmente nas escolas de tempo integral. “É perceptível a ampliação da concentração e a diminuição da ansiedade.”

Por outro lado, os impactos emocionais da nova realidade ainda geram questionamentos. Gisele Costa, mãe de uma estudante, relata que a filha apresentou sintomas de ansiedade no início do ano letivo. “Ela vem me relatando que está sentindo isso e eu acredito que tenha relação com o fato dela não ter mais o celular para ficar olhando o tempo todo”, disse. Apesar disso, reforça a importância de ensinar os filhos a respeitar regras.

Arquivo Pessoal

Além das telas: proibição do celular transforma rotina nas escolas

Psicóloga Thais Nobre

A psicóloga Thaís Nobre também chama atenção para o fenômeno da nomofobia — medo de ficar sem o celular —, cada vez mais comum entre adolescentes. “É uma dependência muito forte de algo que é interativo e que libera hormônios no nosso cérebro. O acompanhamento psicológico é fundamental”, alerta. Para ela, a medida de proibição é válida, mas deve ser acompanhada de suporte familiar e terapêutico. “Você tira um reforço de uma massa. Mas a atenção tem que ser redobrada.”

O estudante Joaquim Cemin Cação, de 15 anos, vê a medida com ressalvas. “A ideia até faz sentido, de que o celular distrai, mas mesmo sem ele a distração continua, agora com conversas e brincadeiras”, aponta. Ele destaca que o uso pedagógico do celular fazia diferença em sala de aula. “Os pontos positivos superavam os negativos. Podíamos pesquisar, ouvir música para manter o foco. Agora há sobrecarga na sala de tecnologia.”

Acervo Pessoal

Além das telas: proibição do celular transforma rotina nas escolas

Para Joaquim as vantagens foram poucas

O jovem também relata que alguns colegas seguem usando o celular escondido, apesar das penalidades. “Depende da frequência. Se o aluno é pego muitas vezes, pode até ser suspenso.”

No centro da polêmica, está a tentativa de equilibrar controle e liberdade, disciplina e acolhimento. A psicóloga Thaís Nobre resume: “A proibição, apesar de drástica, é uma forma positiva de enfrentamento. Mas não basta tirar o celular. É preciso ensinar, observar e cuidar.”

A Lei Federal foi sancionada em janeiro com o objetivo de combater a distração digital, reduzir episódios de ansiedade, cyberbullying e queda de rendimento escolar. Segundo especialistas, o esforço precisa ser conjunto entre escola, pais e profissionais da saúde mental, para formar jovens mais conscientes, críticos e emocionalmente saudáveis.

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