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Coluna Fronteira do Negócio

O impacto da inadimplência em empréstimos com garantia de veículo

Por Luisa Pereira

Da coluna Fronteira do Negócio
Artigo de responsabilidade do autor

Alta dos juros e cenário de crédito restrito pressionam a capacidade de pagamento dos brasileiros

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O crédito com garantia de veículo tem se consolidado como alternativa relevante no mercado financeiro brasileiro, especialmente em tempos de juros elevados e dificuldades de acesso a linhas tradicionais. Segundo dados recentes do Banco Central do Brasil (BCB), o saldo das operações de crédito com veículos como colateral cresceu 8,7% no acumulado até julho de 2025, alcançando mais de R$ 120 bilhões. Porém, junto ao avanço, surge uma preocupação crescente: o aumento da inadimplência nesse segmento, que já se aproxima de 6%, refletindo o impacto da instabilidade econômica sobre a capacidade de pagamento das famílias.

Juros altos e restrição ao crédito tradicional

Desde 2022, a taxa básica de juros se mantém em patamares elevados. Em julho de 2025, a Selic estava em 10,5% ao ano, segundo o Banco Central. Esse cenário encarece o crédito pessoal e reduz a oferta de linhas sem garantias, fazendo com que consumidores busquem alternativas como o empréstimo com garantia de veículo, que geralmente oferece taxas menores em função da segurança do colateral.

Ainda assim, as condições permanecem desafiadoras. Dados do BCB indicam que a taxa média de juros nesse tipo de operação gira em torno de 23% ao ano, acima da média registrada em 2019 e 2020, quando as taxas ficaram abaixo de 20%. O encarecimento reduz a margem de manobra das famílias endividadas, ampliando os riscos de inadimplência.

Inadimplência em alta e seus efeitos

A inadimplência geral no crédito para pessoas físicas alcançou 5,6% em junho de 2025, segundo o Relatório de Estabilidade Financeira do Banco Central. No caso específico de empréstimos com garantia de veículo, o índice é ligeiramente maior, refletindo tanto a pressão da conjuntura econômica quanto a maior exposição do consumidor ao endividamento de médio e longo prazo.

Esse movimento gera preocupações adicionais para o setor financeiro, já que a execução da garantia, isto é, a retirada do automóvel do inadimplente, envolve custos operacionais e, muitas vezes, não cobre integralmente a dívida, especialmente em contextos de desvalorização de ativos ou queda de liquidez no mercado de usados.

O papel do refinanciamento de veículo

Dentro desse cenário, o refinanciamento de veículo tem se tornado uma ferramenta cada vez mais utilizada. Com ele, o consumidor utiliza o automóvel quitado como garantia para obter crédito, muitas vezes com a promessa de taxas mais baixas que em outras modalidades. O Banco Central aponta que esse tipo de operação cresceu de forma consistente nos últimos dois anos, acompanhando a alta da inadimplência no crédito sem garantias.

Embora o refinanciamento ofereça acesso a recursos imediatos, ele também pode se transformar em armadilha se não houver planejamento financeiro. Ao comprometer o bem como garantia, o consumidor expõe-se ao risco de perder o veículo em caso de atraso, o que representa impacto significativo não apenas econômico, mas também social, já que o automóvel é, em muitos casos, essencial para a mobilidade e o trabalho.

Impacto macroeconômico e no sistema financeiro

Do ponto de vista macroeconômico, o aumento da inadimplência em operações com garantia de veículo exige atenção dos reguladores e instituições financeiras. O Relatório de Crédito do BCB destaca que o crescimento do endividamento das famílias já alcança mais de 48% da renda acumulada em 12 meses, o que limita a capacidade de absorver novos compromissos.

A elevação da inadimplência também pressiona os balanços das instituições financeiras, que precisam provisionar recursos para perdas. Essa medida aumenta a cautela na concessão de crédito, fechando ainda mais o ciclo restritivo que já afeta consumidores e empresas.

Perspectivas para o setor de crédito

Apesar das dificuldades, o crédito com garantia de veículo não deve perder espaço no curto prazo. Ao contrário, o Banco Central projeta que esse segmento continue crescendo, impulsionado tanto pela demanda de famílias por liquidez quanto pela necessidade dos bancos de diversificar sua carteira de crédito.

A expectativa é de que, com a trajetória de queda gradual da Selic a partir de 2026, o cenário de inadimplência possa se estabilizar, oferecendo condições mais favoráveis para quem busca crédito e reduzindo o risco de execução de garantias. Até lá, no entanto, o equilíbrio dependerá de políticas de educação financeira e de maior rigor na análise de risco pelas instituições.

Equilíbrio entre acesso e risco

O avanço dos empréstimos com garantia de veículo reflete a busca dos brasileiros por alternativas em meio a um cenário de crédito caro e restritivo. Contudo, o crescimento da inadimplência alerta para os riscos associados a essa modalidade. Se, por um lado, ela oferece acesso a crédito com taxas menos elevadas, por outro, expõe consumidores a perdas significativas em caso de inadimplência.

Nesse contexto, tanto instituições financeiras quanto reguladores e consumidores precisam buscar equilíbrio. A expansão desse mercado é inevitável, mas sua sustentabilidade dependerá da capacidade de mitigar riscos e preservar o papel do automóvel como bem de consumo e ferramenta essencial na vida econômica do país.

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