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Opinião Quarta-feira, 16 de Março de 2022, 07:00 - A | A

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Opinião

A narrativa cruel do Governo Federal e da AGU contra os aposentados na Revisão da Vida Toda

Por Murilo Aith*

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O Governo Federal está orquestrando uma verdadeira crueldade contra os direitos dos aposentados do país. No dia 8 de março de 2022, às 23:31hs, data limite para a finalização do julgamento do Tema 1102, a Revisão da Vida Toda, um fato inusitado aconteceu em sessão de julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF). O ministro Kassio Nunes Marques, que já havia votado contra a revisão dos benefícios, pediu destaque ao processo. Ou seja, a decisão virtual do STF, que foi de 6 votos a favor dos aposentados e 5 contra, poderá ter que ser debatida novamente e presencialmente pelos ministros da Corte, o que pode representar um revés para os segurados.

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Murilo Aith - Artigo

Murilo Aith

 

Importante ressaltar que é faculdade dos ministros e ministras do Supremo o "pedido de destaque", onde processos que estão sendo julgados em plenário virtual (em razão da pandemia) devem ser enviados para o plenário presencial, recomeçando do zero a votação. Este pedido é um mecanismo que busca trazer um julgamento mais resolutivo, visando aumentar a troca de argumentos e informações sobre o caso, também trazendo mais atenção dos ministros para novos fatos apresentados ou a compreensão da matéria.

Este mecanismo é importante para o enriquecimento da controvérsia, ainda mais quando se trata de um direito tão importante, como é a Revisão da Vida Toda. Porém, este tema tratado teve ampla produção probatória e foi abundantemente enriquecido em seu conteúdo.

Entretanto, os dias que sucederam o pedido de destaque forma elucidativos para entender o motivo do uso de tal instrumento. O presidente Jair Bolsonaro e o atual advogado-geral da União Bruno Bianco vieram a público para deixar claro que, além de utilizarem números e uma narrativa contra o STF, não estão preocupados com os aposentados brasileiros.

Bolsonaro verbalizou nesta sexta, dia 11.03, a seguinte frase ao falar sobre a decisão do plenário virtual da Corte Superior sobre a validade de Revisão da Vida Toda: "Querem quebrar o Brasil. Decisão lá do Supremo". A crítica foi direta aos ministros e ministras do STF que votaram a favor dos aposentados. Foram eles: o ex-ministro Marco Aurélio Mello, além de Edson Fachin, Cármen Lúcia, Rosa Weber, Ricardo Lewandowski e Alexandre de Moraes.

A fala de Bolsonaro reforçou a intepretação de ministros do STF de que o pedido de destaque de Nunes Marques, nos minutos finais do julgamento, foi uma tentativa de manipular o resultado final a favor do governo.

Já o Advogado Geral da União (AGU), Bruno Bianco, concedeu uma entrevista a Rádio Bandeirantes, no último dia 10 de março, na qual cometeu uma série de incongruências com relação ao processo e pelas provas que foram juntadas pelas partes, com objetivo cristalino de não reconhecer o direito legal e constitucional dos aposentados a esta revisão.

Bianco utilizou argumentos fraquíssimos e informações que contradizem o próprios INSS na ação. Inicialmente, ele utiliza a tática verbal e uma narrativa falsa que se trata de uma “Revisão do Fim do Mundo”, que vai quebrar a Previdência no Brasil. Falácia pura, igual à do presidente Bolsonaro.

O AGU indica que os aposentados querem declarar inconstitucional e revogar a Lei 9876, de 1999, que dispõe sobre a contribuição previdenciária do contribuinte individual e o cálculo do benefício, o que não é verdade. A lei é constitucional e no STF não defendemos a sua revogação. Ele diz que tal lei “preservou a segurança jurídica para os aposentados”. Aqui vale analisar que esta norma não trouxe segurança jurídica para todos os aposentados que contribuíram com valores altos antes de junho de 1994. A legislação foi positiva para a maioria dos aposentados pois corrigiu problemas provocados pela hiperinflação, mas para uma minoria, ela foi prejudicial. E por isso chamamos a Revisão da Vida Toda de uma revisão de exceção, pois cabe para uma camada mínima de aposentados. É a possibilidade de inclusão dos salários de contribuição anteriores a julho de 1994, quando estes são maiores que os posteriores.

Bruno Bianco diz na entrevista que o plenário virtual do STF foi feito para tratar questões simples, com presteza e rapidez, e para temas nos quais a Corte Superior já tenha se posicionado. E concordamos, pois a questão Revisão da Vida Toda não é complexa, ela é simples, pois visa garantir a segurança jurídica dos segurados do INSS. E também, vale citar aqui, que a Revisão da Vida Toda é baseada no posicionamento consolidado pelo Supremo desde 2013, que é o da revisão pelo melhor benefício, muito parecido com o da Vida Toda, que é regido pelo princípio de que o aposentado não pode ser prejudicado por uma metodologia de cálculo de aposentadoria que mudou no meio do caminho, porque isso fere a segurança jurídica. Esse ponto foi amplamente discutido durante o julgamento da Revisão da Vida Toda. Ou seja, já possui precedentes. E parece que Bianco não se deu o trabalho de ler os votos dos ministros antes de conceder tal entrevista e tentar diminuir a importância da decisão por ela ter sido dada em ambiente virtual.

O advogado-geral também disse aos jornalistas que o julgamento não estava encerrado. Como assim, não estava encerrado? Os onze ministros votaram. O placar foi de 6 a 5 a favor dos aposentados. Vale lembrar que a Revisão da Vida Toda teve seu início no Supremo Tribunal Federal em junho de 2020, iniciando seu julgamento em 04 de junho de 2021 e após 10 votos computados, o processo teve pedido de vistas em 11 de junho de 2021, sendo retomado em 25 de fevereiro de 2022. Foram oito meses de novos estudos sobre o tema, onde as partes trouxeram ao processo todo o material probatório de suas alegações e sendo noticiado por toda a mídia nacional a importância da ação. Portanto, o debate foi amplo, e todos os julgadores puderam embasar as fundamentações dos seus votos.

Vale frisar que o presente processo teve ampla produção probatória, com a juntada de sustentações orais das partes e amigos da corte, parecer do Procurador Geral da República, memoriais, despachos, nota técnica juntada pelo INSS com informações sobre o custo da ação para seus cofres e também o voto divergente do ministro Kassio Nunes Marques. O voto divergente foi muito bem fundamentado, e isso demonstrou a profundidade do debate levado ao Supremo Tribunal Federal".

Bianco dá uma espécie de tiro no pé da defesa do INSS e da narrativa do Governo Federal quando diz que não se sabe para quantos aposentados cabe a Revisão da Vida Toda e também quando cita que o prejuízo financeiro seria de R$ 120 bilhões. Mas como assim advogado-geral, vocês não estão se conversando? Esclareço: O INSS, como estratégia, buscou fazer um terrorismo econômico no STF. Através da Nota Técnica SEI nº 4921/2020ME, que foi juntada no processo, o órgão afirma que o custo da ação é de R$ 46 bilhões de reais, e foi juntada pelo próprio INSS no processo. Um número bem menor do dito pelo Bruno Bianco e oito vezes menos do que o presidente trouxe aos microfones da mídia nacional. E vale destacar que o INSS também, no último dia do julgamento da Revisão da Vida Toda, buscou um grande jornal para expor que a tese geraria um prejuízo de R$ 360 bilhões aos cofres públicos, tentando, de alguma forma, afastar o legítimo reconhecimento do direito reconhecido pelo Supremo. Nenhum dos números dados pelo Governos para órgãos da imprensa nacional batem. Afinal, qual o estudo correto? Qual a verdade sobre os cálculos? O Governo Federal e o INSS sabem realmente quais os impactos? Ou apenas querem confundir a cabeça dos leitores e dos ministros e ministras do STF com relação ao impacto financeiro da ação? Aqui cabe frisar mais uma vez: e Revisão da Vida Toda é de exceção e é válida para uma minoria de aposentados de um período restrito do tempo.

Na entrevista, Bianco também deixa expresso que “o INSS é um cliente da AGU”. Aqui é importante citar que o mais recente ministro empossado do STF, André Mendonça, era o advogado-geral da União em 2021, quando o julgamento da Revisão da Vida Toda já tinha sido iniciado na Corte Superior. Ou seja, aqui fica evidente qual será a linha que o voto do novo ministro deve seguir, caso o julgamento seja recomeçado em plenário presencial. Isso porque a ideia do Governo Federal é que o voto do relator do caso, ex-ministro Marco Aurélio seja substituído pelo voto de Mendonça, o que provocaria uma reviravolta no placar. Uma grande jogada suja.

A narrativa de Bianco, Bolsonaro e o pedido de Nunes Marques causam uma enorme preocupação com a capacidade que esse poder tem para se tornar um mecanismo estratégico que proporciona a atuação individual de um ministro contra o colegiado.

O Supremo Tribunal Federal estava prestes a corrigir uma injustiça com o aposentado, aplicando o seu entendimento consolidado e principiológico de que "jamais uma regra de transição pode ser mais desfavorável que uma regra permanente". Ela é uma "homeopatia jurídica", jamais o veneno. Caso este não fosse o entendimento do Poder Legislativo a norma de transição não seria criada para a proteção de quem já estava contribuindo por décadas ao sistema, e sim apenas a regra permanente.

Após o pedido de destaque foi levantada questão de ordem, que busca dois pontos: impedir a ida do processo para plenário presencial, pois o julgamento teve ampla produção probatória, deixando todos os ministros confortáveis para a apresentação de seus votos. E um segundo, que é a manutenção do voto do relator aposentado.

Não ocorreu um fato novo, e isso deixa claro a preclusão consumativa, pois este pedido de destaque deveria ser realizado antes ou durante o seu voto, e não posteriormente. E vamos além, foi solicitado após a juntada dos 11 votos, tendo conhecimento do resultado final, ferindo frontalmente a segurança jurídica, o juiz natural e a credibilidade do Poder Judiciário.

O STF trouxe nesse julgamento, a esperança de uma vida mais digna aos aposentados, e corrigiu uma anomalia legislativa, pois jamais regras de transição podem ser mais desfavoráveis que regras permanentes. Este não é o intuito do legislador, e essa violação é a base de toda a fundamentação da revisão da vida toda. E o Governo Federal, com seus argumentos apenas de interesses políticos e de batalha ideológica contra ministros da Corte Superior, atua contra os direitos dos aposentados brasileiros.

 

 

*Murilo Aith

Advogado especialista em Direito Previdenciário e sócio do escritório Aith, Badari e Luchin Advogados

 

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Tania Regina Prohmann 16/03/2022

Buscamos a Justiça da qual estamos reféns de aprovação devida aos que contribuíram dentro do período, com parcelas robustas ao INSS, comprovadas em Carteira de Trabalho, cujos registros foram desconsiderados, por ocasião da aposentadoria. Para nós em sua maioria, tais requisitos estão prestes à caducar pelo tempo; além da idade avançada muitos sequer poderão usufruir pelos efeitos favoráveis, caso tenhamos ganho de causa. Os guardiões da Lei STF tem na Legislação, todo amparo jurídico necessário à sua Aprovação. Estamos no aguardo da mesma desde 2013, quando foi-nos reconhecido o melhor benefício. Outrossim em respeito à Corte, solicitamos considerar os idosos aqui representados pelo Dr Murilo. Atenciosamente, Tania Regina Prohmann

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