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Quarta-feira, 27 de Abril de 2016, 10h:22

Após polêmica e protestos, prefeito de Campo Grande veta projeto ‘Escola sem Partido’

Bernal argumentou que proposta viola Constituição Federal e outras legislações federais e municipais

Adriel Mattos
Capital News

Deurico/Capital News

 Prefeito de Campo Grande diz que reajuste menor é culpa dos vereadores

Prefeito de Campo Grande, Alcides Bernal

O prefeito de Campo Grande, Alcides Bernal (PP), vetou totalmente o projeto de lei “Escola sem Partido”. A mensagem de veto foi publicada na edição desta quarta-feira (27) do Diário Oficial do município (Diogrande).

Aprovado em regime de urgência no dia 31 de março, a proposta do vereador Paulo Siufi (PMDB) virou alvo de protestos de estudantes, professores e movimentos sociais. Dias depois, Siufi reconheceu que errou ao apresentar a proposição sem discutir com a população.

 

No texto, Bernal apontou que a proposta é inconstitucional. Ele lembrou que o texto foi rejeitado “pela grande maioria da classe do magistério” e que entidades entregaram manifestos contrários ao projeto.

A Secretaria Municipal de Educação se manifestou citando o inciso VI do artigo 5º da Constituição Federal que garante a inviolabilidade da liberdade de consciência e de crença. Também foram mencionados outros trechos da Constituição e do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) que separam a liberdade de ensinar da liberdade de expressão.

Também é citada a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), que aponta que a educação é dever da família e do estado. A Semed lembra ainda, conforme a LDB, que o ensino deve se basear na pluralidade de ideias, respeito à liberdade e tolerância.

O prefeito aponta ainda que estipular condutas a professores é prerrogativa do Executivo, e o Estatuto do Servidor Público Municipal é a legislação que determina direitos e deveres aos docentes. A Procuradoria-Geral do Município (PGM) reforçou os argumentos da Semed e lembrou que apenas a União pode legislar sobre direito do trabalho.

Por fim, Bernal escreveu que a proposta cria obrigações para a prefeitura e os professores, além de regras que contrariam o Plano Municipal de Educação. Ressalta ainda a violação à Constituição Federal, Lei Orgânica do Município, ECA e LDB.

 

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Deurico/Capital News

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Vereadores e membros de entidades e da sociedade civil se reuniram para debater proposta

Erros
Em 5 de abril, Siufi reconhece em reunião na Câmara Municipal que o projeto foi um erro, já que não houve espaço para debates. “Meu erro maior foi não ter consultado com a Fetems [Federação dos Trabalhadores em Educação de Mato Grosso do Sul], com a ACP [Sindicato Campo-Grandense dos Profissionais da Educação Pública]”, justificou.

O projeto chegou ao gabinete do vereador, foi recebido e assinado por Siufi. “Mandaram [a proposta] e minha assessoria achou que era interessante e a gente assinou e foi”, relembrou. “Li o projeto quando a assessoria trouxe, e não vi que tinha essa celeuma toda. Não entendi e gostaria de entender”, ressaltou Siufi.

 

Um dos signatários da proposta, Herculano Borges (SD) também disse que não esperava tamanha repercussão. “Paulo [Siufi] trouxe o projeto, explicou, achei interessante e eu e mais outros colegas por acreditar que esse projeto não iria causar esse tipo de confronto”, justificou.

Campanha
Grupos lançaram uma campanha na rede social Facebook contra o projeto de lei, que o intitularam “Lei da Mordaça”. Diversas pessoas estão compartilhando fotos com a hashtag #EnsinarEUmAtoPolitico se posicionando contra a proposição.

Na internet, era pedido ainda ao prefeito que vete o projeto. Em nota na época, a Superintendência de Comunicação Social (SCS) da prefeitura informou que Bernal aguardava a proposta chegar ao Paço Municipal para se manifestar. Ele iria decidir se vetava ou sancionava conforme o interesse público.

Izaias Medeiros/Câmara Municipal de Campo Grande

Paulo Siufi

Vereador Paulo Siufi

Texto
Conforme o texto da proposta, seriam afixados cartazes direcionados aos professores para que eles evitem debater temas relacionadas à política, sexualidade e religião com os alunos.

Izaias Medeiros/Câmara Municipal de Campo Grande

Aprovado pela Câmara de Campo Grande, projeto quer proibir professores de discutir política e sexualidade

Da esquerda para a direita: presidente da Câmara, João Rocha (PSDB), Herculano Borges (SD), Dr. Cury (SD), Gilmar da Cruz (PRB), Chocolate (PTB), e Betinho (PRB)

Em sua justificativa, Siufi argumentou que professores usam as aulas para ensinar correntes políticas. “É fato notório que professores e autores de livros didáticos vêm-se utilizando de suas aulas e de suas obras para tentar obter a adesão dos estudantes a determinadas correntes políticas e ideológicas; e para fazer com que eles adotem padrões de julgamento e de conduta moral – especialmente moral sexual – incompatíveis com os que lhes são ensinados por seus pais ou responsáveis”, escreveu.

O projeto é de autoria de Paulo Siufi e subscrito pelo presidente da Câmara, João Rocha (PSDB) e também por Herculano Borges (SD); Eduardo Cury, o Dr. Cury (SD); Gilmar da Cruz (PRB); Waldecy Nunes, o Chocolate (PTB); e Roberto Santana, o Betinho (PRB).

Deurico/Capital News

Luiza Ribeiro

Vereadora Luiza Ribeiro

Votos contrários
Apenas os vereadores Eduardo Romero (Rede) e Luiza Ribeiro (PPS) votaram contra a proposição. Para Luiza, a lei não pode restringir as conversas nas escolas. “É um projeto que agride a ética dos professores. Não devemos fazer com que uma sociedade restrinja as conversas, mesmo no ambiente escolar”, afirmou ao Capital News em 5 de abril.

Deurico/Capital News

Eduardo Romero

Vereador Eduardo Romero

Para Romero, o projeto é antidemocrático e desnecessário. “É um projeto antidemocrático e desnecessário, quando você tem a Lei de Diretrizes e Bases da Educação, que é a LDB, quando você tem a Constituição [Federal], que já dá os rumos de como a educação deve seguir”, disse ao Capital News também em 5 de abril.

O vereador ainda disse que a Câmara ouça a sociedade e mantenha o veto ao projeto. “Espero que a Câmara tenha entendido o recado da sociedade, que mostrou ser contra”, ressaltou.

O que diz a lei
A Constituição Federal, no artigo 205, inciso II, garante “liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber”. O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) ainda dá o direito ao estudante de questionar o que não concorde.

O artigo 53, inciso II, dá ao aluno o “direito de ser respeitado por seus educadores”; no inciso III, assegura o “direito de contestar critérios avaliativos, podendo recorrer às instâncias escolares superiores”. E o artigo 58 estabelece “No processo educacional respeitar-se-ão os valores culturais, artísticos e históricos próprios do contexto social da criança e do adolescente, garantindo-se a estes a liberdade da criação e o acesso às fontes de cultura”.

Já a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional garante que as aulas devem abranger um “pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas” e “respeito à liberdade e apreço à tolerância”, no seu artigo 3°, incisos III e IV, respectivamente.