Quinta-feira, 18 de Abril de 2024


ENTREVISTA Domingo, 11 de Dezembro de 2011, 07:30 - A | A

Domingo, 11 de Dezembro de 2011, 07h:30 - A | A

“A evolução deste País passa pela educação”, considera Roberto Botareli, presidente da Fetems

Valquíria Oriqui - Capital News (www.capitalnews.com.br)

Aos 52 anos de idade, filho de professores e de uma família de nove irmãos, o presidente da Federação dos Trabalhadores em Educação de Mato Grosso do Sul, Roberto Magno Botareli Cesar, formado em Educação Física, fala com orgulho da educação recebida dentro de casa. Os pais fizeram questão de ver os nove filhos com o terceiro grau completo.

Com 14 anos, enquanto muitos adolescentes da mesma idade pensavam em “curtir” a vida, no interior do Paraná, na cidade de Jacarezinho, Roberto, junto com mais dois irmãos e alguns amigos, se iniciou nos movimentos sociais e foi em busca de ajudar aqueles menos favorecidos ou os que, por algum motivo, se desviaram e encontraram o caminho das drogas.

Durante oito anos Roberto foi tesoureiro do secretário de finanças da Fetems, Jaime Teixeira. Em entrevista exclusiva ao Capital News, Roberto fala das condições com que se encontra a educação de Mato Grosso do Sul e sobre a proposta de reajuste salarial do governador aprovada pelos sindicalistas.

A tecnologia nas salas de aulas é outro assunto abordado no decorrer da entrevista. Roberto fala da importância da tecnologia para a educação do País. “Temos que quebrar este tabú, porque senão a vida vai passar, o mundo vai avançar e nós vamos continuar trabalhando com um giz, um apagador e um quadro negro”.

Capital News – A resposta dos sindicatos em relação à proposta do governador do Estado, André Puccinelli, já era esperada? O senhor avalia de forma positiva ou não?

Roberto Magno Botareli Cesar – Eu avalio que este percentual, de 8,33, perante a crise mundial que está colocada para nós, não considero uma proposta ruim. Temos acompanhado o reajuste dos servidores públicos, da União, onde o índice se fala em 0%, nós temos acompanhado dentro do Estado nos municípios que são dados, são reajustes bem inferiores ao que nós conseguimos, com algumas exceções. Então, com o trabalho que foi feito, sem mobilização, talvez com uma mobilização de massa poderíamos ter avançado mais, mas já estamos no final no ano. Mas o fato de não ter encerrado as negociações agora, de o governo ter deixado em aberto até o final de março, acreditamos que possamos avançar mais um pouco em relação à esses percentuais, e nós estamos apostando nisso. Esperamos conseguir para o ano que vem alguma coisa a mais.

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Maioria dos sindicalistas aprova proposta do governador que manterá negociações em 2012
Foto: Deurico/Capital News

Capital News - E se o a proposta não for cumprida, pode haver alguma mobilização?

Roberto Magno Botareli Cesar – A reclamação é que o compromisso do governo era fechar a reforma da lei 87 até julho deste ano, começar o processo de negociação em agosto e fechar as negociações em outubro. Mas ocorreu que tivemos o nosso congresso, houve a eleição da Federação, a mudança de direção, o que acabou atrapalhando os encaminhamentos. O governo também segurou um pouco para poder negociar conosco, deixou para o encerramento dos trabalhos do Poder Legislativo do Estado, isso prejudicou um pouco o processo de negociação. Existe o compromisso de continuarmos a conversa até o dia 31 de março, nós não vamos admitir que deixe para conversar faltando 15 dias para terminar o prazo. Queremos já em fevereiro, no retorno das aulas, conseguir dialogar com o governo em dois pontos: a política salarial e a reforma 87. Se percebermos qu o governo vai deixar para discutir no final de março nós vamos nos mobilizar para pressionar para que retorne o diálogo para que possamos discutir e debater o que foi comprometido na mesa de negociação.

Capital News – O senhor considera positiva a proposta do governador?

Roberto Magno Botareli Cesar – Essa negociação foi feita com muito respeito, diferente das outras, nós tivemos negociações muito duras e ríspidas na mesa, mas esta teve um clima de respeito tanto por parte do governo com o movimento sindical quanto do sindical para o governo. A princípio a nossa proposta era implementar uma política salarial até o final do atual governo para que recebêssemos o piso por 20 horas. O governo disse que era impossível mas que queria diminuir essa diferença. Ele propôs 5% de reajuste num primeiro momento, eu disse que nem ia levar o valor para a categoria. No final da primeira reunião ele chegou a 7%. Em outra reunião, depois de 4 horas de debate e insistência ele concordou em incorporar 5% da regência, nós estávamos pedindo 10%. Isso significa 8.33%, que entendemos que não é uma má negociação.

Capital News - O que diz a lei complementar 087 de 2000?

Roberto Magno Botareli Cesar – Essa lei é o nosso plano de cargo de carreira dos profissionais de educação do Mato Grosso do Sul. Hoje ela tem os professores e tem uma parte da vida do administrativo que está na nossa lei. Queremos avançar em alguns pontos como trazer o doutorado de volta. Gostaríamos de incluir nela um terço que hoje ela prevê 25 % de hora/atividade para o trabalhador, a lei federal em que foi julgada no STF fala em um terço, então está faltando 8% de tempo para hora/atividade. Defendemos isso hoje porque o professor está ficando doente, muita licença médica por conta da sobrecarga de jornada. Um professor de 40 horas com 2 horas/aula por turma vai ter que ter no mínimo 16 turmas com 40 alunas cada uma, somando 600 alunos. Aí serão 600 provas para corrigir, 600 trabalhos... o professor acaba levando essas tarefas para casa. Defendemos um aumento para que o professor faça essas atividades dentro da escola e que, quando ele vá para casa dele ele tenha tempo (uma categoria com mais de 80% de mulheres) de se dedicar aos filhos, ao marido, à família, e para o descanso e o laser. Hoje não acontece isso. Chega final de semana tem professor preparando aula, corrigindo cadernos...isso está fazendo mal para o profissional de educação. Queremos que se cumpra a lei federal, que é um terço da hora/atividade, para resguardar a integridade física e a saúde dos professores.

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Após algumas  negociações duras e ríspidas, Roberto analisa última foi respeitável de ambas partes
Foto: Deurico/Capital News

Capital News – Qual o seu principal objetivo à frente da Fetems?

Roberto Magno Botareli Cesar – Eu tenho uma história de luta que desde os 14 anos de idade me envolvi com movimentos sociais. Aos 14 anos, no Paraná, eu participava de movimentos jovens da igreja católica e criei uma entidade em uma cidade que hoje tem 40 mil habitantes, onde nós tiramos todas as crianças, todos os engraxates da rua e levamos para um local onde demos lições de higiene, encaminhamos para a escola e também fazíamos um acompanhamento social da família. Íamos nas casas, víamos a situação, às vezes as famílias não tinham o que comer e nós íamos atrás. Criamos a missa do quilo onde uma vez ao mês as pessoas levavam o alimento. Era um trabalho muito bonito porque aos 14 anos de idade éramos criança. Com 16 anos eu, dois irmãos e alguns amigos criamos um centro de recuperação de jovens usuários de droga. Essas duas entidades existem até hoje em Jacarezinho: o Cade, centro de recuperação, que atende hoje 120 pessoas, e o Promeja, Promoção dos Menores de Jacarezinho. Depois disso vim para cá e acabei me envolvendo em movimentos políticos e sociais e acabei me envolvendo no movimento sindical. É uma coisa que sempre gostei de defender, principalmente do que é de direito daqueles que fazem parte de uma minoria, pois eu entendo que tem que ter alguém para gritar por aqueles que têm menos privilégios.

Capital News – Como o senhor definiria as condições de trabalho dos educadores em Mato Grosso do Sul? O que é necessário aprimorar?

Roberto Magno Botareli Cesar – As condições de trabalho hoje deixam muito a desejar. Antigamente o professor usava normalmente um quadro negro e um giz, hoje existem outros recursos, mas muito limitados ainda. Os profissionais não estão sendo preparados para usar a tecnologia. A tecnologia tem que vir para dentro da escola, pois ela deixou de ser interessante, a criança só vai para a escola porque o pai a força. Quando ele sai da escola ele vai para uma lan house ou para o computador de casa, ou até no mesmo aparelho celular navegar pela internet. A escola ainda está na época do giz e do quadro negro. Deveriam ter nas escolas lousas mais modernas, quadros eletrônicos, aparelho de som...acho que tem muita coisa para se melhorar e que não custa muito. Ainda sonho que teremos uma escola de ponta. O professor do mercado de trabalho de hoje também tem que se adaptar. Vejo que há resistência em relação à tecnologia por parte de um grupo pequeno de profissionais. Temos que quebrar este tabu, porque senão a vida vai passar, o mundo vai avançar e nós vamos continuar trabalhando com um giz, um apagador e um quadro negro.

Capital News – Há professores que dizem que é necessário sala mais arejadas e ainda reduzir o número de alunos por turma. Qual é a média de alunos por sala?

Roberto Magno Botareli Cesar – Temos salas com até 55 alunos. Você imagina uma sala com 55 alunos e um professor sem microfone para se comunicar com esses alunos. É humanamente impossível e a tendência é ficar doente mesmo, criar calo nas cordas vocais, sair da função e o Estado ter que contratar outro profissional. O número ideal seria o que está estabelecido no Plano Nacional de Educação, no ensino médio seria na faixa de 35 alunos por turma, nas séries finais, na faixa de 25 a 30 alunos, nas séries iniciais, de 20 a 25 alunos por sala. Um número pequeno onde o professor possa dar atenção e trabalhar. A criança vai para a escola sem saber ler nem escrever. Tem um professor para uma turma de 35 a 40 alunos. É muita criança para um professor só alfabetizar. Isso acarreta em crianças mal alfabetizadas que concluem a educação básica, vai para a universidade (a universidade também peca) e isso vai virando uma bola de neve. É de fundamental importância que o número de alunos por sala de aula diminua, para que a qualidade avance mais rapidamente do que já tem avançado.

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MS ocupa o quinto lugar no ranking dos Estados no que diz respeito aos salários dos professores
Foto: Deurico/Capital News

Capital News – Quantos municípios do Estado praticam o piso salarial para os educadores? Como está o trabalho?

Roberto Magno Botareli Cesar – Em Mato Grosso do Sul temos de seis a sete municípios que não pagam o piso. Avançamos bastante nesta questão. Somos um dos Estados que mais avançou. Na federação somente 17 Estados pagam o piso Estadual. Isso é ruim, porque é um piso muito baixo, de R$ 1.187 para início de carreira e os governos ainda não entenderam que a evolução deste País passa pela educação. Em campanha só se fala isso, que a prioridade dos candidatos é a educação a saúde e a segurança, só que depois esquecem esses compromissos e não priorizam, não investem em educação. Educação não é gasto. Um povo bem educado vai ter menos presídio, menos gente presa e a qualidade de vida vai melhorar. Para que isso aconteça é necessário que se invista no profissional, invista nas escolas para que ofereçam às crianças desse País uma qualidade de ensino boa e que o aluno tenha desejo de ir para dentro da escola para aprender e ser preparado para enfrentar a vida.

Capital News – Qual o piso do professor hoje?

Roberto Magno Botareli Cesar – O piso nacional é de R$ 1.187 por uma jornada de até 40 horas. O Estado para R$ 1.325,92 para 40 horas.

Capital News – Qual o piso que a classe pede hoje?

Roberto Magno Botareli Cesar – Nosso desejo é de que o piso nacional seja pago por 20 horas e não por 40. É um salário baixíssimo. Mato Grosso do Sul é o quinto Estado com melhor salário piso do País, para se ter idéia de como o profissional da educação ganha mal.

Capital News – Quantos professores existem em Mato Grosso do Sul?

Roberto Magno Botareli Cesar – Na rede Estadual e Municipal somam-se próximo a 50 mil professores. Nós temos filiados a Federação em torno de 25 mil.

Capital News – A maior dificuldade hoje é aplicar o piso para uma jornada de 20 horas?

Roberto Magno Botareli Cesar –
Isso tem que ser construído com o tempo, porque se você pegar R$ 1.325 por 40 horas e dobrar ele para dois mil e pouco de uma hora para outra, a gente sabe que não tem orçamento que suporte com a economia que temos hoje. Temos procurado aumentar ano a ano o valor do piso nacional para que daqui a cinco anos estejamos com o piso de 20 horas. Gostaríamos que fosse implementado a partir de janeiro o piso para 20 horas mas também sabemos que é impossível de se dar um reajuste de 50% para alcançar este objetivos. Acredito muito no diálogo e no processo de negociação, onde ano a ano estamos tentando desenvolver política salarial até o final do governo do André, para que possamos lá na frente ter diminuído esta diferença.

Capital News – Qual a opinião do senhor sobre esta ação movida por MS e outros estados no Supremo Tribunal Federal (STF) contra a hora/atividade dos professores?

Roberto Magno Botareli Cesar – É lamentável, acho que foi um erro do nosso governador. Insistimos para que ele tirasse o nome dele das ações mas ele entendeu que deveria manter e entende que não vai dar um terço até hoje. Mesmo perdendo a ação ele insiste em não cumprir o que determina a lei federal. Ele alega que o Estado será obrigado a contratar mais dois mil professores para cumprir a lei. Só que a lei diz que, se provar que os recursos oriundos da educação não foram suficientes, a União complementa para pagar o piso.

Capital News - Então porque ele não aceita?

Roberto Magno Botareli Cesar - Quem tem que responder isso não é o Roberto, é o governador. Se eu fosse o governador com certeza teria cumprido a lei antes do julgamento do STF, desde a instituição dela, porque eu acredito que isso melhora a qualidade de ensino, nós temos exemplos em Três Lagoas, município pioneiro do Estado, implementado pela vice-governadora Simone.

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Para o presidente da Fetems, adotar o piso salarial para 20 horas, é difícil, mas não é impossível
Foto: Deurico/Capital News


Por Valquíria Oriqui - Capital News (www.capitalnews.com.br)

 

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marcos paz 20/12/2011

Parabéns Roberto pela entrevista e por ter serenidade na condução dos destinos dos trabalhadores em educação do MS. Precisamos de lideranças que exercitam o diálogo e sejam comprometidas verdadeiramente com as causas do oferecimento de uma educação pública de qualidade

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