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Quinta-feira, 12 de Julho de 2018, 10h:03

Grupo vai discutir políticas públicas para tratamento de pessoas com anemia falciforme

Representantes de entidades ligadas ao movimento negro, de profissionais da saúde, da ALMS e da Secretaria de Estado de Saúde vão trabalhar juntos

Flávio Brito
Capital News

Wagner Guimarães/ALMS

Grupo vai discutir políticas públicas para tratamento de pessoas com anemia falciforme

Da esquerda para a direita: Romilda Pizani, Mariana Croda, João Grandão, Ana José Alves e Berenice Kikuchi

Grupo de trabalho, formado por representantes da sociedade civil e do governo, vai discutir políticas públicas para o tratamento da anemia falciforme, doença que acomete, sobretudo, a população negra. A decisão resultou da audiência pública “Saúde da população negra – anemia falciforme”, realizada na tarde desta quarta-feira (11), na Assembleia Legislativa, por proposição do deputado João Grandão (PT), em parceria com o Coletivo de Mulheres Negras de Mato Grosso do Sul “Raimunda Luzia de Brito”.

 

Inicialmente, o grupo de trabalho terá participação de representantes de entidades ligadas ao movimento negro, de profissionais da área de saúde, da Assembleia Legislativa e da Secretaria de Estado de Saúde (SES). Entre as primeiras decisões a serem tomadas pelo grupo, destacam-se a realização de seminário para tratar sobre a anemia falciforme e a ativação de comitê que delibere quanto a ações relacionadas ao tratamento da doença.

 

Outras formas de enfrentamento à enfermidade foram discutidas na audiência pública e, certamente, serão retomadas pelo grupo de trabalho. Foi levantada a necessidade de preparação dos profissionais da área de saúde para o atendimento e tratamento de pacientes com anemia falciforme, principalmente nas unidades básicas. Também foi proposta a realização de campanhas de informação e sensibilização quanto à doença.

 

Para contribuir ao fomento dos debates, que resultaram na decisão de criar o grupo de trabalho, a enfermeira Dra. Berenice Assumpção Kikuchi, presidente da Associação de Anemia Falciforme de São Paulo, palestrou sobre a doença. Berenice tem especialização em Anemia Falciforme pela University of the West Indies, em acordo bilateral Brasil e Jamaica e é uma das maiores autoridades brasileiras no assunto.

 

Origens e características

A especialista fez a retomada histórica da origem da anemia falciforme, problematizando a ideia comum de se tratar de “doença de negros”. Berenice explicou que o gene da enfermidade, o HBS, resultou de mutação que demorou de 70 mil a 150 mil anos e que foi reação ao plasmodium falciparum, um dos parasitas da malária. "As pessoas com anemia falciforme não são resistentes à malária”, salientou.

 

Ela acrescentou que quatro grupos étnicos africanos – Bantu, Benin, Senegal e Camarões – foram acometidos pela doença. Com o processo de escravização dos negros, a enfermidade foi para além dos limites do continente africano. “A anemia falciforme está presente em todos os continentes e é uma doença socialmente negligenciada”, notou. “Não se trata de uma ‘doença de negros’ e, sim, de ancestralidade africana”, enfatizou Berenice.

 

A especialista enumerou diversas complicações clínicas provocadas pela doença: icterícia por hemólise (coloração amarelada da pele), anemia hemólise, infecções de repetição, dactilite (inchaço das mãos e pés), sequestro esplênico (sangue sequestrado para o baço, causando inchaço da barriga), crises oclusivas (fortes dores), acidente vascular encefálico, úlcera nas pernas e priapismo (ereção peniana dolorosa sem relação com desejo sexual).

 

Dados apresentados por Berenice indicam a alta incidência da doença entre negros comparativamente à presença nas demais etnias. Uma das estatísticas informadas pela especialista mostra que a anemia é encontrada na proporção de um para mil pessoas na população em geral. No caso dos negros, essa equivalência é de um para 500. Ou seja, a anemia falciforme tem o dobro de presença na população negra.

 

Autoridades

Além de Berenice, compuseram a mesa de autoridades o deputado João Grandão, a superintendente geral de Atenção à Saúde da SES, Mariana Croda, a presidente do Fórum Permanente das Entidades do Movimento Negro de Mato Grosso do Sul, Romilda Pizani, e a presidente do Coletivo de Mulheres Negras, Ana José Alves. A assistente social, advogada e militante do movimento negro, Raimunda Luzia de Brito, também participou da audiência e compôs a mesa durante os debates. 

 

“Ainda falta muito conhecimento sobre anemia falciforme. Por isso, essa audiência é muito importante. Foi criado um grupo de trabalho e será definido se faremos um seminário, se vamos reativar o comitê. A reunião foi muito positiva”, avaliou o deputado João Grandão.