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Cotidiano Sábado, 17 de Março de 2018, 09:58 - A | A

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Justiça

Indígenas acusados de homicídio contra policiais serão levados a júri popular

Magistrados entenderam haver indícios de que os réus praticaram os crimes e, portanto, devem ser julgados pelo Tribunal do Júri

Flávio Brito
Capital News

Mais de dez após caso envolvendo a retomada de território e o conflito por terras no Estados, indígenas serão levados a júri popular. A 11ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3) confirmou sentença da proferida pela 1ª Vara Federal de Dourados, que havia determinado o julgamento, por meio de júri popular, de três indígenas acusados de duplo homicídio qualificado e uma tentativa de homicídio contra três policiais, em 1º de abril de 2006, na rodovia MS-56, distrito de Porto Cambira.

 

A denúncia apresentada pelo Ministério Público Federal conta que os índios Márcio da Silva Lins, Sandra Arevalo Savala e Valmir Júnior Savala atacaram os policiais Rodrigo Pereira Lorenzato, Ronilson Magalhães Bartiê e Emerson José Gadani, mediante emboscada e outros recursos que dificultaram a defesa das vítimas. As condutas resultaram na morte das duas primeiras vítimas e tentativa de homicídio da última.

 

Os réus recorreram da decisão ao TRF-3, alegando, entre outras questões, legítima defesa do território, que o interrogatório policial se deu sem a presença de um intérprete e que os réus são relativamente incapazes de entender o caráter ilícito da conduta.

 

Contudo, o desembargador federal Fausto De Sanctis, relator do recurso no TRF3, manteve a sentença de pronúncia. Segundo ele, há nos autos “indícios mínimos a apontar a ocorrência dos eventos criminosos mediante o incentivo e a colaboração dos acusados, presos em flagrante, corroborada pelo interrogatório policial dos acusados, depoimento da vítima e de testemunhas”.

 

Para o desembargador, os elementos de prova não amparam de modo nítido e irretorquível que a conduta dos acusados teria ocorrido na legítima defesa do território indígena. “Em que pese eventual direito de posse, isso não retira dos brasileiros o dever de respeito à lei, inclusive por comunidades indígenas parcialmente ou integralmente adaptadas (como se revelou neste caso), num contexto já extremamente tenso e delicado”, salientou.

 

O magistrado ainda afirmou que “se não houve, por parte dos indígenas, ou eventualmente dos que agiram no interesse deles, o socorro ao Judiciário para concretização da posse que consideram justa, a análise da adequação das condutas deve ser verificada pelo Tribunal do Júri, que decidirá acerca dos limites da legítima defesa invocada, bem como sobre seu eventual excesso, e também sobre as demais excludentes penais”.

 

Sobre a ausência de intérprete, o desembargador observou que o interrogatório não desrespeitou a diversidade linguística, pois os mesmos descreveram os fatos de forma detalhada, o que demonstra a compreensão que detinham, com ratificação na presença de procurador da Funai.

 

Ele também discordou do laudo antropológico que afirma que os réus eram, ao tempo da ação, relativamente incapazes de entender o caráter ilícito das condutas. Segundo ele, os exames de sanidade mental revelam que os réus se comunicam bem em português, mostram-se conhecedores das normas e regras sociais e eram capazes de compreender o caráter ilícito dos fatos e de determinarem-se de acordo com esse entendimento.

 

“A despeito de sua cultura própria, para os indígenas ora acusados, a vida humana possui relevante valor moral e ético. Tinham o dever de preservá-la. Portanto, se faz presente a potencial consciência da ilicitude, na medida em que os acusados possuiriam conhecimento da imoralidade, antissocialidade e lesividade de sua conduta”, afirmou, concluiu. Assim, a 11ª Turma entendeu, por unanimidade, que as condutas dos réus, bem como as qualificadoras, devem ser apreciadas pelo Tribunal do Júri.

 

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